2005-08-12

Até já (mas deixo um desafio)



E pronto!

Sigo para férias hoje. Vão ficar sem mim durante três semaninhas, se tudo correr bem. E bem que estou a precisar delas!

Como não deve haver por perto qualquer computador, muito menos com acesso à Internet, sintam saudades ou nem por isso.

Quanto a mim, resta-me deixar-vos qualquer coisinha enquanto por cá não estou: um desafio, claro!

E qual é o desafio?

Fácil! Já se tinha falado do assunto nas Vozes e limito-me a traze-lo para um post: digam-me quais são as musiquinhas que acham que seriam as mais indicadas para uma daquelas danças bem quentes que até os mortos pensam em regressar à vida. Sim, dessas mesmas: aquelas que as mulheres bem conhecem porque vêem autênticas ressurreições e os homens adoram espreitar.

Lá mais em baixo, deixei o "Fever", da Peggy Lee. Agora, deixo só um bocadinho do "This is Hardcore", dos Pulp (porque sou uma naba nestas coisas de encontrar música e não arranjei nenhuma completa) só para dar o "mood" certo.

Espero, quando regressar, ter as caixas de comentários cheias de (boas) propostas. Afinal, sexo é bom e a gente gosta. E se houver uma musiquinha para animar a festa, melhor ainda!

Até já :)

2005-08-11

Paint It Black

Dear Bill,

Today is February 13, 1984. I came to this black wall to see and touch your name, and as I do I wonder if anyone ever stops to realize that next to your name, on this black wall, is your mother's heart. A heart broken 15 years ago today, when you lost your life in Vietnam.

(...)

They tell me the letters I write to you and leave here at this memorial are waking others up to the fact that there is still much pain left, after all these years, from the Vietnam War.

But this I know. I would rather to have had you for 21 years, and all the pain that goes with losing you, than never to have had you at all.


Mom




Esta mãe - Eleanor Wimbish -, perdeu o filho no Vietname e, todos os anos, no mesmo dia, deixa uma carta ao filho, por baixo do nome dele, no Memorial dos Veteranos do Vietname, em Washington.

Há anos, ouvi esta carta ser lida (pela Susan Sarandon, se não estou enganada) num dos documentários mais brilhantes e mais dolorosos que conheço, chamado "Dear America - Letters Home from Vietnam".

É dos poucos filmes sobre guerra que conheço que, em lugar de alguma maneira a glorificar, a torna perfeitamente terrífica. Porque são palavras simples, de gente simples, num ambiente aterrador, à procura de um pouco de esperança, de um pequeno carinho e cheiro a lar, feito palavras.

Palavras para o outro lado do mar. Como as palavras que chegavam e partiam a Portugal nos aerogramas, para tantos e tantos dos nossos soldadinhos que vinham "numa caixa de pinho/do outro lado do mar".

Na televisão, neste preciso momento, andam a fazer um apelo à memória dos últimos cinquenta anos de História deste nosso Portugal. E eu penso em todas as mães que perderam os seus filhos "do outro lado do mar", que podiam, tal como Eleanor Wimbish, escrever ainda hoje as palavras da dor, as palavras da memória.

O "Paint It Black" é da banda sonora do "Full Metal Jacket" ("Nascido para Matar", 1987), de Stanley Kubrick. E, para mim, faz todo sentido ler a carta de Eleanor Wimbish ao som desta música.

Encontram mais cartas (incluindo esta) aqui.

E que tal este desafio?


aqui



A iniciativa é de
Divas & Contrabaixos.

Os textos estão aqui.

E as regras do concurso estão aqui.

Eu descobri via Bastet e já lá fui deixar qualquer coisinha :)

2005-08-10

Contando letras


foto de Ricardo Araújo


Pudesse eu não ter laços nem limites
Ó vida de mil faces transbordantes
Para poder responder aos teus convites
Suspensos na surpresa dos instantes!

Sophia de Mello Breyner Andresen – Pudesse Eu



Depois do negrume do texto lá de baixo, apetecia-me trazer luz para a Voz.

E, como ando parca de ideias e estou a gostar desta coisa de ter música para dizer o que calo, permitam-me que fique em silêncio, com as palavras de Sophia e a Voz de Jeff Buckley.




Hallelujah - Jeff Buckley

(anti)natura

O toi, le plus savant et le plus beau des Anges,
Dieu trahi par le sort et prive de louanges,

O Satan, prends pitie de ma longue misere!

Charles Baudelaire


Ontem, a fazer zapping pela TV, já semi-inconsciente - ando ultimamente com um sono que nem me seguro -, fui parar a um daqueles programas ditos científicos. Uma coisa cheia de imagens de laboratório, doenças raras, síndromas mais raros ainda e células, muitas células, estaminais e das outras. Até por lá apareceu a falecida ovelha Dolly, morta muito antes do suposto e sem que ninguém ainda tenha a certeza se o facto de ser um clone ajudou a empurrá-la para o céu das ovelhinhas.

O certo é que me parece necessário estabelecer em boas bases o limite "de vida" até onde se pode mexer.

Se é verdade que as células do nariz podem curar uma espinal medula seccionada, venham daí mais estudos. Se for possível implantar células estaminais para regenerar um fígado de um desgraçado que tem um tipo de sangue tão raro que não há lista de dadores que lhe valha, venham daí as células. Mas é preciso saber parar!

E o Homem alguma vez soube parar?

Na verdade, o Homem sempre sonhou ser um Homem Novo, um Homem Melhorado, o espécimen perfeito. No entretanto, reclamou a soberania do planeta sobre todas as outras espécies. Impôs a sua presença como a mais daninha das pragas, reproduz-se loucamente, exaure recursos e impõe domínio.

Uma das questões que se colocavam no programa - com direito a entrevistas e estatísticas de amostragem por países - era se a Natureza (assim mesmo, com maiúscula, para poder englobar tudo) não acabaria por, de alguma forma, se vingar desta nossa geração travestida de criatura e criador. Não há resposta para isso, certo? Só uma catrafilada de perguntas novas...

E uma das propostas no programa era a proibição total, a nível mundial, das experiências de clonagem com seres humanos. Só que eu não conheço uma única lei mundial e, muito menos, reconheço a qualquer organismo a capacidade para a implementar.

Estamos, portanto, em presença de um Homem que apeou as divindades e, agora, quer ser criatura e criador, quer clonar vida, ousa pensar fazer selecção de fetos e de espécimens a caminho do Homem melhorado, ou da imortalidade possível, isto se pelo caminho a inteligência não o levar à total auto-destruição.

Um dos cientistas desculpava-se com a hipótese do mundo acabar mais depressa numa explosão einsteiniana do que num suspiro mengueliano. E a comparação deixou-se petrificada. Porque Einstein rabiscou muita coisa em caderninhos e quadros negros, mas Mengele fez trabalho de campo, um horripilante trabalho de campo.

Mas, pelos vistos, não importa medir sequer as barbaridades que são ditas, desde que não se perca o quinhão da busca da imortalidade.

A Natureza logo há-de ver o que nos faz....

2005-08-09

Fever - desafio da Jacky


A Jacky pediu. Eu bem lhe disse que ia ver para onde me fugiam as teclas. E, cá está, fugiram-me para o "Fever", apesar de hoje a canícula ser bem mais suportável.



Fever - Peggy Lee



Pôs a música a tocar enquanto ele estava no banho. Enquanto esperava a sua vez de ir para dentro da banheira lavar o sabor dele do seu corpo, dirigiu-se para à sala e pôs o "Fever" da Peggy Lee a tocar.

Nunca soube resistir àquela música. O corpo dela sempre encontrou em cada tempo da música o tempo certo para um requebro provocador. E ia cantando alto enquanto dançava. Bem Alto. Tão alto que nem deu conta do chegar dele.

Achou curioso vê-lo envolvido no roupão de banho dela. Aquele amarelo clarinho ficava-lhe bem. E ele vinha ainda fresco, molhado e ela estava quente, despenteada, dançando febril um "Fever" que não parava de tocar.

Ele encostou-se à parede ao lado da porta da sala a mirá-la. E ela continuou a dançar. Dançar e cantar. Mais e mais. Quente. Muito quente.

Ele deixou-se ficar. Deliciava-se com a dança dela, toda só para ele agora, olhos nos olhos, os seios baloiçantes, as mãos dela que, volta e meia, iam, sorrateiras, agarrar-se ao corpo dele para um passo de dança mais arrojado. E agora ele era o poste onde ela se enroscava e desenroscava, como se de um daqueles postes nos salões das strippers. E ela escorregava por ele abaixo e acima. Rodava. Rolava. De frente agora. Depois de costas.

E sentia que o "Fever" já não era só dela. Era deles os dois. Abriu-lhe o roupão de banho. Dançou ainda mais um ou dois passos rebolados roçados nele. Agarrou-se ao poste e desceu por ele abaixo ainda mais uma vez.

E foi então que lhe sentiu as convulsões por todo o corpo. O quente que estava. A febre. A forma como quase desfalecia contra a parede enquanto ela o mimava ainda de carinhos ritmados.

E o "Fever", no entretanto, ia chegando ao fim...

...what a lovely way to burn...


___
E, Jacky, não vale baldares-te aos teus próprios desafios. Era só o que faltava!

Nagasáqui


aqui


Este é pela cidade irmã do meu Porto. A cidade onde desaguaram os primeiros portugueses "narigudos". Pela cidade que sofreu a segunda bomba atómica, como se o objectivo não fosse mais o de experimentar um segundo método, em vez de levar à rendição uma Nação já rendida. Talvez por isso, Nagasáqui ainda me choque mais do que Hiroxima. Porque já sabiam como era e, ainda assim, a demência acéfala da guerra quis cobrar mais umas quantas vidas. Muitas vidas. Demasiadas vidas.



El mismo viento que rompió tus naves

es el que hace volar a las gaviotas


Óscar Hahn - El Doliente

2005-08-08

Bandas Sonoras


aqui



There's no place for us
What is this thing that builds our dreams
Yet slips away from us

Who wants to live forever?
Who wants to live forever.....?

There's no chance for us
It's all decided for us
This world has only one sweet moment
Set aside for us

Who wants to live forever?
Who wants to live forever.....?
Who dares to love forever
When love must die?

But touch my tears with your lips
Touch my world with your fingertips
And we can have forever
And we can love forever
Forever is our today

Who wants to live forever?
Who wants to live forever?
Forever is our today
Who waits forever anyway?


Confesso que gostei do "Highlander". Pronto! Está confessado. "It's a Kind of magic", certo?

Depois vieram as sequelas e estragaram a magia toda. E isso também não é novidade nenhuma.

Não gosto do Christopher Lambert. Aqueles olhos tortos e miopes causam-me calafrios. Mas gostei da história rocambolesca, apesar da quantidade de cabeças decepadas. E gostei, especialmente, da ideia de solidão a que Connor está condenado. A solidão de viver para sempre, vendo todos quantos poderia amar desaparecerem num dos breves minutos da sua vida imortal.

Mas, na verdade, acho que me perdi de amores pela Banda Sonora do filme. Sem ela, são só imagens, planos, sem sentimento. Com a música a tocar bem alto, o filme ganha brilho. A culpa é dos Queen, portanto :)

E ver a história de Connor e Heather a caminhar para o fim ao som de "Who Wants to Live Forever" é arrepiante para qualquer coração que ainda não perdeu o romantismo.

Quem quer viver para sempre?
E quem quer esperar o "para sempre"?
O "para sempre" é nosso hoje!

Sinal


Posted by Picasa


Era um sinal bem escuro sobre a pele amorenada. Um sinal bem ali a indicar o caminho para a virilha. Um sinal perfeito, redondinho. Num sítio perfeito, tão perfeito como os arrepios que lhe sentia no corpo cada vez que passava sobre ele a ponta dos dedos, a ponta das suas unhas. Ou tão perfeito como o ver do corpo dele arquear-se ao sentir a sua língua a circular aquele pequeno, redondo e prefeito sinal.

Mas aquele lindo sinal vai ter de sair. Vai ter de desaparecer da paisagem do seu corpo. Ela vai sentir saudades daquele sinal, do saber que ele ali estava, mesmo quando escondido. Do saber que ele sabia quando ela estava a pensar naquele lindo sinal e do brilho que lhe via de antecipação nos olhos. Igual ao brilho que, provavelmente, já bailava nos olhos dela.

Vai agora percorrer de forma diferente o espaço do seu corpo. Escorrer ainda assim as unhas, os dedos. Mas agora vai passar a lamber uma cicatriz. E vai faze-la sua, tão sua como antes tinha feito seu aquele sinal. Vai continuar a descer desde o seu umbigo na diagonal, tacteante. Virar como de costume para a marca onde estava um dos X do seu mapa do tesouro. Vai deixar de encontrar esse sinal que lhe dizia sempre que podia avançar mais e mais...

Mas vai reconstruir o mapa visual e sensitivo do baixo ventre do seu corpo. É lá que ele sabe que ela mais gosta de repousar as suas mãos sempre que já não há repouso que a satisfaça.

2005-08-07

Dead words on deaf ears

For what, was said the frivolous response which is now clear
Dead words on deaf ears

God Forbid - Dead words on deaf ears



Foi o primeiro jornal que vi por dentro. Que vi como se faz. Lembro-me das rotativas, do cheiro de papel e tinta misturados, do fascínio de ver como, a correr todos os dias, se cumpria a dedicação diária de pôr as notícias na rua.

Não serei a melhor pessoa para escrever sobre a morte de mais um jornal. Não os compro. Nenhum deles.

Mas gosto de ver que existe um grito de luta. E vou sempre admirar os resistentes, os que não baixam os braços, os que querem continuar apesar de todas as pressões que o vil metal nos impõe, cada vez mais, no dia a dia.

E este post é para todos quantos ainda não baixaram os braços. Para os que encontraram neste nosso espaço da net a que tantos chamam já blogoesfera, a alternativa para continuar.

Não tem rotativas. Nem cheiro a papel e tinta. Mas tem a vontade.

Para todos os que fizeram, desde sempre, O Comércio do Porto e, hoje, ainda se recusam a baixar os braços, fica aqui a minha homenagem.

E fica também um pequeno pedido aos que vierem à Voz ler este post: encham aquele blogue de page views.

Já agora, façam o mesmo pelo "A Capital", que encontram aqui.

2005-08-06

60 anos depois




Quando eu tinha os meus doze, treze anos, uma amiga ofereceu-me um poster com um gigantesco cogumelo atómico sobre um fundo azul. Ainda o tenho, velhinho já, de tantas voltas e revoltas e a forma inclemente como o tempo sabota o vigor do papel.

No fundo da imagem, em letras garrafais, lê-se ainda "Will They Ever Learn?"

A pergunta continua sem resposta. E, para mim, continua a fazer sentido colocá-la.

Robert Oppenheimer's name has become almost synonymous with the atomic bomb, and also with the dilemma facing scientists when the interests of the nation and their own conscience collide.

Quase todas as notas biográficas sobre Robert Oppenheimer começam assim. A sua recusa em dar seguimento a investigações sobre uma bomba de hidrogénio ainda mais potente, após ver os resultados de Hiroxima e Nagasáqui, fizeram dele uma figura perseguida, não por qualquer crime supostamente cometido, mas pela sua consciência. Existia uma moralidade inata em Oppenheimer e uma ética que não quis transpor. Foi acusado de ter simpatias comunistas e ostracizado.

E, no entanto, já duas bombas tinham explodido, matando milhares, de forma caótica, sem rosto. Morte avulsa, vinda do nada, sem aviso. Morte suja, que alastrou por décadas, que ainda hoje guarda resquícios....

Moralidade e ética à posteriori? Talvez Oppenheimer tivesse a desculpa de não imaginar sequer - para além de teorias e mapas assépticos - a dimensão da hecatombe.

Mas e os que vieram depois dele? Os que não se recusaram a inventar as tais bombas ainda mais potentes?

"Will They Ever Learn?"

2005-08-05

Insónia

Espera-me uma insónia da largura dos astros,
E um bocejo inútil do comprimento do mundo.

Álvaro de Campos – Insónia



aqui


(Há noites em que chego a entender o desespero...)



Olhos de mocho cegos pela luz, iludem-se de sombras e negrume. Esgueiram-se pelos espaços da penumbra, buscam o brilho lamparina, os rosas da alvorada. As horas sucedem-se. No escuro.

Na TV, um qualquer sorriso pepsodent sujeita a mente a ser infiltrada e iludida de chamamentos de compras fáceis e inúteis, promessas fast-food com digestões inacabadas. O livro para onde se salta queima-nos os olhos; e sentem-se as palavras a bailarem por entre linhas cada vez mais borrões, soletram-se ideias com inferior perícia que um rato de laboratório, esquece-se o início da frase no permeio da cefaleia atordoante.

O relógio estancou na madrugada. O Sol esqueceu-se da caminhada que nos prometeu. A Lua é um traço envergonhado no céu.

As voltas sucedem-se entre lençóis enrodilhados, almofadas que ganham gumes, o silêncio que nos golpeia os tímpanos com o clamor da noite, os pensamentos absurdos que não se conseguem amordaçar, o latejar de todos os fantasmas nas têmporas.

Exaustão, por fim. Estendem-se os braços, estendem-se as pernas, estende-se o silêncio... O relógio volta a encontrar passo. Rasgos de luz comecem a irromper pelo meio dos espaços. A penumbra ganha volume. As sombras retraem-se. O dia recomeça por entre a neblina.

(É hora de acordar. E não dormi. E a neblina instala-se em mim.)


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origialmente aqui

2005-08-04

Resumo de um dia banal


aqui


Sou eu hoje, meia pirada e acalorada, é o bichinho que, coitadinho, nem a carvão quer andar e é um País todo a arder.

Um dia de merda, portanto...

Até amanhã!

2005-08-03

(a)moralidades

d'un coté la guerre et les conquêtes, et de l'autre le progrès du despotisme, s'entraident mutuellement... les princes conquérants font autant la guerre à leurs sujets qu'à leurs ennemis...

Rousseau - Jugement sur la Paix Perpétuelle



A guerra poderá alguma vez ter justificação? E a guerrilha, parente pobre e suja da guerra? E o interesse de qualquer estado poderá alguma vez exigir comportamentos amorais? Ou serão antes eles rapidamente propostos, desculpando-se o uso de um "terror menor" contra um terror sob a alçada de legitimidade de um estado terrorista? E como se mede o terror? Em números de vítimas? Em números de vítimas evitadas? Ou apenas pelo silêncio dos que nem como vítimas se podem afirmar?

Já agora: ainda alguém se lembra dos Hutos e dos Tutsis? Dos Balcãs? Da Indonésia pré e pós Timor? Dos Khmers? Do Afeganistão? Da recusa dos EUA em aceitarem a jurisdição do Tribunal Penal Internacional?...

Hoje estava a pensar nos ataques terroristas de Nova Iorque, de Madrid e agora de Londres. Em todos reconheço um caracter amoral, as vidas inocentes perdidas sem aviso, sem hipótese de salvação.

Mas alguém se lembra como a História parece sempre capaz de lavar as morais das diferentes histórias? Vamos apanhar e condenar todos os Noriegas e todos os Pinochets depois de eles perderem valia para as politiquices do costume?

A verdade é que me parece que não há aqui novidade alguma. Só mudam os lados vitimados e as dimensões das hecatombes.

2005-08-02

Simbolismo


Entre nós e as palavras há metal fundente
entre nós e as palavras há hélices que andam

e podem dar-nos morte violar-nos tirar
do mais fundo de nós o mais útil segredo
entre nós e as palavras há perfis ardentes
espaços cheios de gente de costas
altas flores venenosas portas por abrir
e escadas e ponteiros e crianças sentadas
à espera do seu tempo e do seu precipício

Ao longo da muralha que habitamos
há palavras de vida há palavras de morte
há palavras imensas, que esperam por nós

e outras, frágeis, que deixaram de esperar
há palavras acesas como barcos
e há palavras homens, palavras que guardam
o seu segredo e a sua posição

Entre nós e as palavras, surdamente,
as mãos e as paredes de Elsenor

E há palavras nocturnas palavras gemidos
palavras que nos sobem ilegíveis à boca
palavras diamantes palavras nunca escritas
palavras impossíveis de escrever
por não termos connosco cordas de violinos
nem todo o sangue do mundo nem todo o amplexo do ar
e os braços dos amantes escrevem muito alto
muito além do azul onde oxidados morrem
palavras maternais só sombra só soluço
só espasmo só amor só solidão desfeita

Entre nós e as palavras, os emparedados
e entre nós e as palavras, o nosso dever falar

Mário Cesariny - You Are Welcome to Elsinore


Neste meu umbigo escondido, as palavras bailam ainda. Dançam uma melodia inventada em acordes dissonantes. Escoa-se a afinação, redefine-se a própria música. Bailam palavras, são nosso útero. Ou cordão umbilical tecnológico onde prendemos umas quantas de horas que se transformam em romaria. Uma romaria de festa e de palavras. Palavras amestradas ou agrestes, doces ou iradas. Palavras bailarinas, dançando em frente a um écran. São também armas de arremesso ou de defesa e ironias de pacotilha, estilhaçadas, sem desígnios novos ou resignadas. Palavras ainda. Palavras e mais palavras. À espera. Palavras suspensas, humanismo circense engalanado. São cordas, lianas, grilhetas. São cones de vulcão ou simples lagos. São mar, onda, deserto, fogo. São caminho. Destino às vezes. Pontes suspensas prenhes de simbolismo. São vertigem, fundo negro, luz além. Palavras em confessionário asséptico e vazio, teia ressequida de desencontros.

Se fosse a alma a teclar, não viveria eu de silêncios? Ou já tenho a alma plena de palavras que vou preenchendo de sentidos?

2005-08-01

Bye bye!

A natureza deu ao homem duas cabeças, mas sangue insuficiente para circular em ambas ao mesmo tempo.

Provérbio (se não é, devia ser) popular






A coisa é simples. Bem simples até. Tão linearmente clara na sua simplicidade que até nem merece muitas palavras.

Pois vejamos: convidam-nos para jantar, marcam o dia e assim. Como quem está deste lado até é pessoa para levar compromissos a sério, estranha a falta de notícias ao chegar ao fim da tarde. Já farta, manda sms. "Sempre se janta?"

A resposta é simples. Aliás, é tão simples que só pode vir de uma mente muito simples: "Chegaste atrasada. Para a próxima tens de perguntar mais cedo".

Olha-me um caramelo a fazer-se de difícil. ihihihih

Atrasada? Alô!?!?! Pensa bem na figurinha aqui da "je"... Tens a certeza?

Resposta sai de seguida: "Certo! O dia de S. Nunca também me parece bem".

Nem que fossem ostras e Moet & Chandon!

E ainda se espantam por não perceberem as mulheres... Só não sei como aguentamos nós tamanha simplicidade. Uma simplicidade daquela a raiar o néscio. Dizem que é desses o Reino dos Céus...

Bem, nunca fui bem comportada e sempre achei o Inferno muito mais prometedor...

Bye sucker!