Portugal construiu-se através da emigração. Durante séculos, milhões de portugueses partiram em busca de melhores condições de vida - para o Brasil, França, Alemanha, Suíça, Estados Unidos, Venezuela, África do Sul. Nas décadas de 1960 e 1970, mais de um milhão deixou o país. Praticamente todas as famílias portuguesas têm alguém que emigrou ou descende de emigrantes.
Esses portugueses beneficiaram da abertura de outros países. Construíram comunidades, enviaram remessas que sustentaram famílias e a economia nacional, integraram-se em sociedades que lhes deram oportunidades. Muitos enfrentaram discriminação, trabalhos duros, saudade - mas foram acolhidos.
Agora que Portugal recebe imigrantes, surge uma resistência paradoxal. Pessoas cujos pais ou avós foram "os brasileiros" em França ou "os portugueses" no Canadá manifestam hostilidade contra brasileiros, indianos ou bangladeshis que chegam. Esquecem que também foram os "outros" algures.
Esta ironia não é exclusivamente portuguesa - repete-se em vários países de emigração que se tornaram destinos de imigração. Mas em Portugal torna-se particularmente evidente pela recência e escala da emigração portuguesa. Ainda há milhares de portugueses a emigrar anualmente, enquanto crescem discursos anti-imigração em casa.
A memória coletiva parece ter um horizonte curto. Vale recordar que a empatia que hoje se nega a outros foi essencial para a sobrevivência dos nossos no estrangeiro.
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