2016-10-24

Democracia

A democracia é como a liberdade: vai haver sempre quem saiba delas abusar. E será também como uma certa ideia de justiça, aquela que nos permite defender que é preferível um culpado solto do que um inocente na prisão.

Os conceitos em si nada têm de errado; o que uns quantos fazem com esses conceitos, deturpando-os, adaptando-os aos seus interesses, corrompendo o seu sentido, é que sim.

Não culpo a democracia, como não culpo a política, como não desbarato por completo os conceitos operativos com que aprendi a pensar o real e a inserir-me nesse mesmo real como ser político. Mas culpo quem usa e abusa da política, até tantos de nós que se mantém sempre confortavelmente arredados da política e da polis e dos mais básicos exercícios de cidadania. Os mesmos que apenas se lembram do Estado quando chega a hora de estender a mão, num exercício de demagogia em tudo semelhante à daqueles a quem entregamos a responsabilidade de nos governar esperando que não se governassem apenas a eles mesmos.

Talvez afinal os culpados sejamos todos nós, habituados a uma certa ideia de democracia e demitidos de direitos e deveres. É porque tantos de nós se mantém assim de fora que o exercício político virou coutada de uma classe. E, como todas as classes, zelosa dos seus privilégios, temerosa de perder o pé, a viver à conta de quem apenas reclama e que nem sequer levanta o cu para ir votar.

Fomos nós que fabricamos o monstro; não foi a democracia.