2006-06-29

Sumo de laranja (2)


Hadjni colorida, by Claire Fressynet


O desafio do "Sumo de laranja" ainda está a dar....

Ora vejam...
http://lineaclaire.blogspot.com




(eu resolvi trazer a imagem, Gaivina. Afinal, a Hadjni triste já cá estava, não é?)


Obrigada, Claire!

O tempo perguntou ao tempo...


aqui


Gosto das minhas rugas. E gosto de ver rugas nos outros. São os nossos mapas pessoais, sinais de que não passamos de forma demasiado leve pela vida, que soubemos fazer sulcos em nós e, se os fizermos bem, sulcos nas memórias dos outros. E essa deve ser a melhor resposta a dar ao tempo...


(e eu talvez volte a ter tempo para os blogues lá para Domingo...)

2006-06-27

Carcanhol


aqui


No meio das minhas várias manias, há a mania de que sou independente. Ganho o meu dinheiro, tenho a minha casa, tenho o meu carro, pago o que devo, controlo os vícios, imponho regras a mim mesma para que não venha ninguém de fora e me sujeite a obrigações.

Tudo o que tenho saiu do meu esforço. Não necessariamente porque tinha de ser assim, antes porque quis que fosse assim. Do que tenho e de como faço a gestão do que tenho, não dou satisfações a ninguém, excepto a mim mesma.

Assim, da mesma forma que deixava de ir para os cafés fazer grandes lancharadas, porque a semanada era pequena e eu tinha os meus (outros) vícios, como os cigarros e os cafés, ou da mesma forma que esticava o que ganhava no Verão de maneira a poder comprar livros e música, ainda hoje sou de um forretice atroz no que toca ao meu dinheiro. É que não quero ter de pedir; e também não quero ficar sujeita e não ter onde ir buscar.

É por isso que me esforço por manter uma poupança, na velha máxima do guardar do riso para a chora. Uma dor de barriga acontece a qualquer pessoa e eu não saberia viver sem ter um bocadinho ali de lado, para qualquer eventualidade.

Acho que devo ter sido educada numa mentalidade quase espartana no que toca a isto, já que sempre preferi guardar a esbanjar e raramente associo à posse de bens materiais qualquer tipo de felicidade. Na verdade, prescindo de muita coisa porque acho demasiado cara, não necessariamente porque não tenha dinheiro para comprar. E há coisas que nunca sujeitaria a taxa de juro, como as férias. Quem não tem dinheiro não tem vícios, sempre foi o lema por aqui. Andar doze meses a pagar uma semana de férias parece-me demasiado absurdo e só deve fazer sentido para aqueles que não sabem fazer contas. Digo eu, claro, que sou uma Tia Patinhas em potência...

E isto vem a propósito de quê? Bem, é que estou a preparar-me para trocar de carro. E já ando com pesadelos só por adivinhar o emagrecimento da pobre conta bancária. Mas ao fim de dez anos de vida, bem puxados e esticados, o bichinho já merece a reforma...

Parabéns, Lilla :)


aqui

2006-06-26

Viva!

(A ver e rever o golo de Maniche aqui.)



Se já estava descadeirada, agora já nem sinto nada. A festa no Porto continua rija e, não tivesse eu que levantar-me daqui a (demasiado) poucas horas, ainda havia de estar a festejar.

Agradeço aos "nuestros hermanos" o empréstimo do vídeo e os comentários. Eu já não consigo comentar mais nada: além de não ter voz, não sei se tenho coração para outro assim...

2006-06-25

Estou toda descadeirada!


aqui

Gosto desta expressão. Diz exactamente o que parece: como se nos tivessem tirado o sustento do final da costas e, de um momento para o outro, transportar o corpo vira agrura. E é mais bonito do que dizer “estou toda partida”, ainda que na prática signifique exactamente o mesmo. Mas ficar toda partida afigura-se-me uma coisa muito trágica, com muito sangue e vísceras à mistura. Estar descadeirada é quase uma piada, uma consequência, como o resultado de qualquer joguinho infantil em que alguém tira a cadeira a outro alguém, que acaba esparramado no chão, pés ao alto, saias levantadas.

É! Gosto da expressão. Só não gosto quando faz tanto sentido neste Domingo, enquanto me arrasto pelo dia à espera da Selecção…

2006-06-23

Venha a sardinha!


aqui

Santo António já se acabou
O São Pedro está-se acabar
S. João, S. João, dá cá um balão
Para eu brincar



(Mas onde raios estava eu com a cabeça ao achar que algum dia ia ter tempo e assunto para manter um blogue diário?)

2006-06-22

2006-06-21

Por um milagre...




Às vezes acontece o impossível. Mas é só às vezes. Só que os dias fazem-me sempre de oportunidades...



(hoje sou angolana)

2006-06-19

Acho que estou com febre...

Doctor, doctor, give me the news...


Found at bee mp3 search engine

Hoje, era rock da pesada... E a pedra que não seria! E rolávamos juntos. Ou só ficávamos então lado a lado, que está muito quente para abraços, ou então sou eu que aqueço demais quando me abraças. Releio o teu mail e rio sozinha. E lembro-me como sempre gostei de te ler. E deve ser por isso que fique a salivar pela resposta à miga que o computador apagou. E, raios!, vê se a escreves outra vez, ponto por ponto, para sentir-te aqui pertinho, rir dos disparates e das coisas sérias, calar a falta que me fazes hoje e a vontade de virar amuleto de boa sorte, enquanto revirávamos os corpos, as roupas, o quarto. Ou a sala, até. Quanto mais tenho mais quero, loiro. E estou com saudades tuas, porra!




Parabéns, gadjo!

I'm feelin okay this morning
And you know,
We're on the road to paradise
Here we go, here we go


Talking Heads - Road to Nowhere

Tenho o despudor de pensar que fiz a diferença; que talvez tenha estendido a mão no momento certo, que ajudei no processo que te levou a onde estás hoje, pronto para ser pai, pronto para transferir todo o teu ego para esse ser pequenino que será, sempre, a melhor coisa que fizeste no mundo. E é com esse despudor, como se para todo o sempre eu tivesse alguma responsabilidade, que posso – que devo – desejar-te toda a felicidade que mereces. Somos sempre responsáveis por aqueles que nos querem bem; por aqueles a quem queremos bem. E tu és parte de mim, apesar da distância e do tempo que vai passando inclemente. E este é só mais uma maneira de te desejar felicidades no teu dia de anos. E dar-te os parabéns pelo rapaz.

2006-06-16

Antes que o dia acabe...


aqui

... deixar em passo de corrida um beijo enorme de parabéns à Sofia.

Rotina

Futuro en las entrañas sueña el trigo,
Llamando al hombre para ser testigo...
Mas ya el hombre a su lado duerme muerto.

Rafael Alberti - Vuela La Noche Antigua De Erecciones


Tudo se afunila num tempo cada vez mais curto. As ordens das prioridades não nos permitem grandes devaneios. Mesmo que a vontade de repouso num qualquer instante seja grande. Mesmo que até já se tenha aprendido a fazer paragens estratégicas nas rotinas. Ainda assim, o tempo continua a fugir-nos, como grãos de areia por entre os dedos.

2006-06-14

É para amanhã?

tu que buscas companhia
eu que busco quem quiser
ser o fim desta energia
ser um corpo de prazer
ser o fim de mais um dia

António Variações - Canção do Engate


É para amanhã? Bem que podíamos fazer hoje. É que o amanhã pode nem chegar. Se estás livre, eu também estou livre... E buscamos companhia, não é?

Entre o vazio da solidão, porque não a aventura dos sentidos, feita a dois neste momento que nem é de amor, porque o amor não é o tempo que o faz, nem a espera, nem a partilha. É só não ter tempo para amar, nem vontade de estender uma mão aberta pronta a fechar-se sobre um vazio igual.

Enchem-se as mãos antes de tacto e de pele, do calor do outro corpo e os pés que assim não estão gelados pela madrugada, excepto se foste embora, ou porque mandei, ou porque este não é o sítio onde ficares.

Estamos sós e o resto pouco importa. Somos dois e maiores e o sexo disseram-nos que não é tabu. Foder a dois, mesmo que pouco mais sejas do que o viabrador que acabei de comprar online, é sempre melhor do que foda nenhuma.

É só mais um dia que passa, pouco importa. Tratemos de o aproveitar. Gozemos o tesão que se acumulou durante mais um dia de frustrações e que bem que estarias entre as minhas pernas nesta fila interminável de trânsito em que o carro avança e recua num pára-arranca desesperado, enconado.

Dispo o teu corpo de personalidade. Não quero saber quem és. Quero a liberdade do corpo trespassado de prazer e sem grilhetas. O resto fica para amanhã. É sempre para amanhã.

Não, não me digas que podemos fazer o amor hoje. Hoje podemos brincar a fazer amor, não o amor. Deixa esse para amanhã, quando tivermos tempo e o jantar não seja mais do que qualquer coisa descongelada à pressa. É que não é o tempo que faz o amor, mas eu não sei fazer amor sem tempo. E no meu léxico há muito que cabem as rapidinhas e outros simulacros.

É uma coisa de geração, sabes? Ainda ouvimos dentro dos miolos o Variações a cantar que só estamos bem onde não estamos. Ou da urgência de ter um corpo e não deixar para amanhã o que podemos fazer hoje. Ou do urbano-depressivos, sempre bem fodidos, nem que seja só pela vida e do chique que, por vezes, esse ar nos dá.

É para hoje? Não, deixa para amanhã...

Hoje, continuamos a foder para não falar. Ou fodemos para acabar. Ou fodemos só porque nos disseram que tinha de ser, que todos fodem afinal. Ou só para não ficar a mastigar a perna de frango ultracongelada, em pé na cozinha, sem pachorra para cozinhar. Foder fast-food, de geração fast-food, a correr atrás do hoje que perdeu logo pela manhã.

De que momento falas afinal? O momento em que faço de conta que me dou e tu fazes de conta que te dás? Amanhã continuamos à espera de uma vida. Amanhã é um fio de esperança que ainda tentamos encontrar.


É para amanhã? Bem podias fazer hoje...


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Em Abril, a Maria Árvore pediu-me um post para publicar lá no Chez Maria. Este foi o post que escrevi e que hoje - porque não tenho paciência para continuar a aguentar as sufecas do Blogger - resolvi trazer para a Voz. Apesar do tom, amargo e desencantado, gosto dele. Além disso, as férias que depois fui gozar foram muito satisfatórias e fizeram milagres pelo meu estado de humor...

2006-06-13

Porreiraça?


Não me lembro de alguma vez ter acartado caixotes ou sequer lavado a loiça. Mas também não vinha dai nenhum mal ao mundo...

("roubado" à Jacky)

2006-06-11

Cacofonia


Elena Ryazanoff


No silêncio da noite, dois corpos aninham-se em partilha de calor e meiguice. Em silêncio, abraçam-se seguindo as mesmas curvas, pele contra pele. Depois, um pequeno roçar de nádegas contra o escroto convulsa as entranhas e apenas sobra uma palavra: desejo. E não carece de mais do que isso, para virar potência em movimento, para que as tuas mãos subam ao meu peito e me forces a virar o corpo, até que te alojes no meio das minhas pernas e a intimidade vira apenas energia.

É fome, sim. Esta fome de saber que o desejo é voraz na vontade de engolir um desejo igual, enquanto os corpos famintos encontram a forma silenciosa de se degustarem até à exaustão.

Os corpos não se regem por palavras, pelo desassossego da multiplicidade de sentidos, do caos babélico à espera de interpretação. E é nos gestos mais pequenos que medimos rapidamente o mais difícil neste jogo: a intimidade muda que explode numa cacofonia de significados.

2006-06-09

É para seguir o link!


Desde esse dia anda cabisbaixo e desiludido. Fecha-se lá em baixo a ouvir discos de blues e come muito mal. Aquece doraditos nas chamas do inferno e de vez em quando dá um pulinho ao Purgatório para comer torradas mas não fica muito tempo. Tem o olhar melancólico e um par de cornos. É má onda cornos, é o que eu sempre digo.


Sobre a Besta, no Mastros ao Alto. Do melhor!

Nada!


Antony and Johnsons & Rufus Wainwright
What Can I Do

2006-06-08

Olha!!!


aqui

Enquanto tantas vozes emudecem, descubro que ele está de volta...

E depois descubro que ela também.



Revendo filmes...


aqui

Que dites-vous?... C'est inutile?... Je le sais!
Mais on ne se bat pas dans l'espoir du succès!

Edmond Rostand - Cyrano de Bergerac


O Cyrano é uma personagem belíssima, capaz de fazer 1001 versos às qualidades do seu apêndice nasal e incapaz de suportar os comentários alheios ao mesmo. Seria sempre o melhor dos apaixonados se não lhe tivesse faltado a coragem para perceber que, na maioria dos casos, as mulheres vão sempre preferir quem lhes escreve belas cartas de amor…


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(Hoje apeteceu-me regressar ao filme de Jean-Paul Rappeneau, com um magnífico, ternurento e profundamente comovedor Gérard Depardieu. E, como sempre, aquela cena final parte-me o coração.)

2006-06-07

Verde


aqui


E apetecia-me apenas um relvado verde e molhado, com erva cortada rente e há pouco, para mergulhar os pés descalços em solo fresco e vida. Dispenso bolas, bandeiras, buzinas, selecções e qualquer outro comentário absurdo aos jogos que hão-de vir.

Enjoei o que ainda não foi e, compulsivamente, vomito já este tal de Mundial.

2006-06-06

A data


aqui

Aqui está a sabedoria. Aquele que tem entendimento calcule o número da besta, pois é numero de homem. Ora esse número é seiscentos e sessenta e seis.

Apocalipse, 13-18


A data de hoje tem piada, não acham? Até a escolheram para lançar um filme que regressa à mitologia do Anticristo e à génese do mal...

E, no entanto, sendo o número da besta o número de 'um' homem, ou simplesmente 'de homem', a verdade é que está afastada qualquer natureza extraterrena das trombetas do apocalipse.

2006-06-04

Mountains of Madness


aqui



Talvez o meu mal – ou o meu bem, que vai depender sempre da perspectiva – é ter passado a minha adolescência a ouvir coisas que, para muitos, não passavam de ruído. “Hör mit schmerz” (ouvir com dor) era uma opção, sentida, entranhada, onde a pop industrial berlinense encaixava, a par de nomes como um sempre presente Nick Cave ou uma Diamanda Galas, ou até mesmo as profundamente doloridas Vozes Búlgaras, de um folclore que não o era apenas. Não para mim, pelo menos.

De então para cá, tenho seguido, nem sempre de forma muito fiel, os nomes dessa adolescência cada vez mais longínqua, assumindo a evolução dos músicos como um amadurecimento, tal e qual o que me ia acontecendo a mim, ao meu gosto, ao que me apetece sempre ouvir. Blixa Bargeld continua a ser uma referência. Como não? Pois se anda o dedinho dele, a par com o de Nick Cave, na banda sonora do Der Himmel über Berlin, de Wim Wenders. E eu sou fã desse filme, da sua banda sonora, de tudo o que me faz sentir de cada vez que o revejo.

Dos Einstürzende Neubauten retenho também até hoje o nome de Alexander Hacke. Perdi-lhe o rasto por uns tempos, reencontro-o agora, junto com os Tiger Lillies, num projecto arrojado, misturando imagens e sons, voltando a colar o electrónico ao pessoal, ao humor, ao espectáculo pleno.

E é assim que, hoje, a convite da Cota Marada, sigo para Serralves à espera de magia. Estou certa que acontecerá. Já não há uma audição dolorida de uma música estranha. Mas suspeito que não acabou a dor. Apenas se transformou em algo mais. Mais adulto, talvez. Menos crua, num cabaret do macabro. É que já não somos os mesmos, depois de duas décadas. E já nada pode ser tão a preto e branco. É por isso que vou à espera que este fim de férias e de domingo se vista de cor e luzes. E música, claro.


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Adenda:


Nem encomendado tinha sido melhor. E até o tempo – noite magnífica – esteve do lado da festa. Espectacular!

E ver Adrian Huge (o percussionista que se deliciou a destruir a bateria na última subida ao palco) a apregoar os CDs foi um bónus. Aliás, a simpatia dos músicos depois de três “encores”, quando já não se podia pedir muito mais, foi mesmo a cereja no topo do bolo.

Quanto ao espectáculo – que foi de graça – pagaria o que fosse para rever. E para todos aqueles que sabem o quanto sou forreta, acho que isto resume tudo.

E, Babs, procurei-te no meio do povo. Se não estavas lá, arrependes-te pela certa :))

Quanto a ti, devias ter ficado até domingo :P

Parabéns, Frogas


aqui


Pensavas que me esquecia? Nunca! Espero que tenhas um dia muito feliz.

Parabéns, sapinho. Que contes muitos.

2006-06-03

A Norte


Paredes de Coura


Mais do que as igrejas a enfeitarem os cimos das serras, ou as penedias transformadas para a oração, ou o granito talhado, talvez a comunhão mais profunda se faça no meio das serras frondosas, engalanadas de vida. Sou, verdadeiramente, pó e ao pó voltarei. Mas também sou seiva e luz coalhada e brisa fresca e margens de rios frescos e impolutos. Sou como a estrada perdido, bordejada de campos e vinhas que, por trás de cada curva, insinua mais um espanto. Sou como as estrelas que se voltam a ver e o luar novo que nada alumia. Ou como as barreiras amuralhadas que escondem casas brancas e ruas limpas, rasgadas apenas pelo vento norte e fazem ainda frente a um inimigo que já não há, enquanto os canhões silenciosos se cobrem de musgo e, por entre as pedras das flecheiras, nascem pequenas flores amarelas.

Sou esta terra alegre, verde e quente. Sou velha como as pedras de que herdei a história no sangue. Sou como a brisa e a água, frescas e sempre presentes. Ou este calor que se desprende dos sabores, da malga de vinho verde tinto, da boroa e dos rojões. Ou o cansaço de andar de lado para lado e não ver tudo o que seria de ver, que não há tempo para mais quando nos perdemos nas estradas que seguem por entre terreolas geminadas com as que vêm logo a seguir, mudando o nome do mapa e permanecendo o mesmo encanto.

Nomes a seguir a nomes, sempre surpresas gargalhadas ou tão só o espanto de ver finalmente o nome que, antes, não tinha qualquer sentido no mapa mental da nossa geografia limitada. Terra linda, esta. Terra quase em paz, apesar dos tantos de carros que lhe calcinam os silêncios, ou as televisões sempre ligadas, ou esta mania de esparramar bandeiras em nome de uma selecção de um País que, afinal, mal conhecemos.

E, depois, quase nos dói na alma ver que o Norte já esteve a arder. Por entre o prazer partilhado da tarde, via-se o fumo negro a caminhar em direcção ao pôr-do-sol, ameaçando transformar o amarelo alaranjado numa mancha vermelho sangue. Mais um pedaço de verde que se perde. Mais um retalho de vida transformado em cinzas. E, tendo eu andado perdida por estas terras, cheirando o fresco do verde que nos enche os pulmões de esperança, choro cada tronco chamuscado, cada árvore caída, cada ninho quebrado, cada pedaço de mim assim desaparecido.

O meu coração está sempre com o verde, os cheiros e os sabores do Norte, mesmo que, por vezes, um pedaço dele resolva viajar até ao Sul.

2006-06-02

(…ainda em férias)


Braga, Bom Jesus

Tolhe-me de desdém o que em nome de qualquer divindade se instiga. Abomino o papel menor que quiseram dar (e dão ainda) à mulher ou aos que consideram hereges, ou até àqueles que, não o sendo, escolheram uma opção de vida fora dos cânones bolorentos e, por isso mesmo, são até hoje deixados nas bordas da prece.

Li demasiados Camus e Satres para ser Wicca. Nunca deixei de ser "estrangeira" na fé. Cusquei demasiado nos orientais para ainda ter uma noção única do divino. Temo a organização da crença, porque abomino qualquer prelúdio de fanatismo. Não sou sequer baptizada. Não sou nada, se calhar. Gosto de me pensar agnóstica. Acredito, não venero. Falo com o divino na primeira pessoa. Não gosto que me medeiem aquilo em que escolho acreditar.

Mas abro a boca de espanto, arregalo os olhos e persigno-me antes de entrar nas bonitas igrejas, nas maravilhosas catedrais, ou nas simples capelas esculpidas nas rochas. Há uma grandeza no granito talhado das terras do Minho e da Galiza que nos põem, verdadeiramente, em contacto com a divindade.

Depois… bem, depois olho para baixo e vejo os ex-votos e as caixas de esmolas e, rapidamente, volto a assentar os pés no chão.