2009-08-12

Dos discursos

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«Suponho que em toda a sociedade a produção de discurso é, ao mesmo tempo, controlada, seleccionada, organizada e redistribuída por um certo número de processos que têm por fim conjurar-lhe os poderes e os perigos, dominar-lhe o acontecer aleatório, evitar-lhe a pesada, a temível materialidade.»

Michel Foucault - A Ordem do Discurso



Às vezes o ruído à nossa volta – especialmente o que se sente proveniente dos três canais generalistas e de mais todos os jornais dos mesmos grupos de interesse, acrescentando ainda todos os discursos de todos os políticos – deixam-me com vontade de silêncio. Um silêncio que desconstrua discursos, desconstrua demagogias, tape a boca aos demagogos.

Mas por mais que procure o silêncio e já nem tente sequer prestar atenção aos discursos de circunstância e às desculpas de ocasião, sei que vai haver sempre demagogia em abundância, especialmente se os políticos da treta encontrarem justificações para a própria estultícia.



(a ERC é, cada vez mais, uma evidente treta; até quando finalmente parece ter alguma ideia com um mínimo de fundamento)

4 comentários:

Bartolomeu disse...

Por mais que me esforce e diga não, não pode ser é impossível, não consigo encontrar outro "culpado" que a democracia.
Contudo, cedo-lhe um benefício, não o da dúvida, mas o da certeza. A certeza que estes demagogos se aproveitaram "dela" a desonraram e prostituíram, tornando-se nos seus xulos. Está exaurida esta "senhora" que poderia ter proporcionado a este povo as maiores conquistas sociais. No entanto, mesmo esventrada vilipendiada, exangue, não a abandona esse bicho vil, corrupto, demagôgo, abusador, que continua a apresenta-la na praça pública, disfarçada com panos coloridos, oferecida como se de virgem pura e casta se tratasse.
O mais giro é ka maralha come-a por isso.
E vai d'embute!!!

mfc disse...

Mas já não conseguíamos viver sem este ruído de fundo,,,
Achas que conseguias?!

Hipatia disse...

A democracia é como a liberdade, Bartolomeu: vai haver sempre quem saiba delas abusar. E será também como uma certa ideia de justiça, aquela que nos permite defender que é preferível um culpado solto do que um inocente na prisão. Os conceitos em si nada têm de errado; o que uns quantos fazem com esses conceitos, deturpando-os, adaptando-os aos seus interesses, corrompendo o seu sentido, é que sim. Não culpo a democracia, como não culpo a política, como não desbarato por completo os conceitos operativos com que aprendi a pensar o real e a inserir-me nesse mesmo real como ser político. Mas culpo quem usa e abusa da política, até tantos de nós que se mantém sempre confortavelmente arredados da política e da polis e dos mais básicos exercícios de cidadania. Os mesmos que apenas se lembram do Estado quando chega a hora de estender a mão, num exercício de demagogia em tudo semelhante à daqueles a quem entregamos a responsabilidade de nos governar esperando que não se governassem apenas a eles mesmos. Talvez afinal os culpados sejamos todos nós, habituados a uma certa ideia de democracia e demitidos de direitos e deveres. É porque tantos de nós se mantém assim de fora que o exercício político virou coutada de uma classe. E, como todas as classes, zelosa dos seus privilégios, temerosa de perder o pé, a viver à conta de quem apenas reclama e que nem sequer levanta o cu para ir votar. Fomos nós que fabricamos o monstro; não foi a democracia.

Hipatia disse...

Claro que conseguia, Manel. Havia de encontrar muito onde verter o fel e outros bombos da festa das piadas. E acho que passava a poupar a mim mesma muitos – demasiados – esgares de nojo que apenas contribuem para o envelhecimento precoce da minha pele e uma falta de pachorra sistemática da minha paciência em contramão.