2007-02-26

O Rouxinol


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Conta Hans Christian Andersen que havia um pequeno rouxinol que vivia nos jardins do Imperador da China. E que chegavam visitantes de todo o mundo para admirar o Palácio do Imperador e os seus jardins. Mas saiam de lá maravilhados apenas com o cantar do rouxinol. Tão maravilhados que escreviam loas e trovas ao canto do rouxinol e livros e artigos e histórias. E esses textos chegaram às mãos do Imperador da China, que não conhecia o pequeno rouxinol, mesmo vivendo ele no seu jardim. Mas mandou buscá-lo e, ao vê-lo, quedou-se pasmado perante um pequeno e simples pássaro cinzento. Nunca o imaginaria tão vulgar. Mas o rouxinol cantou e nunca mais o Imperador soube viver sem o seu cantar... de tal forma que obrigaram o rouxinol a viver na corte, dentro de uma gaiola dourada, ainda que ele clamasse que o seu canto só ficava bem entre o verde das árvores e o azul do céu.

Então um dia ofereceram ao Imperador um maravilhoso rouxinol mecânico, cravado de pedras preciosas, banhado a ouro e a prata, que cantava quando lhe davam corda uma das canções do pequeno rouxinol verdadeiro. E o Imperador e a corte ficaram maravilhados perante a beleza de tal jóia, especialmente quando confrontada com a simplicidade do pequeno rouxinol cinzento e modesto. Tentaram pô-los a cantar em conjunto, mas a experiência não resultou: o pequeno rouxinol cantava livremente o que lhe ia na alma; o rouxinol mecânico cantava sempre o mesmo programa previamente decorado e ensaiado à exaustão, mesmo que cantasse sempre afinado e em bom ritmo e em perfeita correcção. Mas o Imperador preferiu o pássaro mecânico, até porque ele cantava sempre a mando, sempre o mesmo trecho, quantas vezes as pedidas e sem dar mostras de cansaço. Além disso, o pequeno rouxinol gostava de se escapar, desatento, pela janela fora. O Imperador achou, portanto, que fazia a melhor escolha ficando com o pássaro mecânico e fê-lo cantar de novo e de novo e de novo... até que a corda do seu mecanismo emperrou.

Anos depois, o Imperador adoeceu e não havia quem desse algo pela sua recuperação. Sozinho, no seu leito de doente, apetecia-lhe ouvir música. Mas o seu lindo pássaro dourado, coberto de pedrarias, não cantava, esgotado o repertório e as cordas do mecanismo, por mais que o poderoso Imperador lhe ordenasse uma música. Então, inesperadamente, pela janela aberta do quarto, entrou o mais maravilhoso dos trinados, que encheram o pobre e doente Imperador de canções de esperança e de conforto. E o corpo fraco do Imperador recuperou as suas energias, à medida que o pequeno e vulgar rouxinol lhe dava vida de novo com o seu canto livre, sem precisões de mecanismo de relógio, puro e belo na forma, no estilo e na vontade. Diferente a cada momento; belo e perfeito por isso mesmo.


(O Gaivina lá descobriu qual era o conto...)

2 comentários:

Miguel Horta disse...

É Ou!È Ou! Sou ave mas não sou burra!

Hipatia disse...

Gaba-te cesta!...

:P