2009-12-30
Ah pois continua
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Balanço
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Contra a corrente
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Digo-vos quais são os meus blogues do ano: todos os que não sucumbiram ao politiquês e às lutas intestinas, que continuam sem fazer do insulto arma, que não transpiram ódio em cada pixel, que são mantidos por gente que não tem de dar o cuzinho e três tostões para ser alguém na tugolândia, que não se venderam ao pilim e colunita de pasquim barato, que continuam por cá na carolice. O resto, é mais do mesmo e já se estava à espera.
2009-12-29
Parabéns, Vanus!
2009-12-28
2009-12-27
Ágora
No século IV, uma mulher podia ser directora da Biblioteca mais grandiosa de que há memória, o seu conselho era procurado pelos maiores intelectuais do seu tempo, a sua palavra respeitada e ouvida, o seu trabalho científico tido como de primeira água e os seus ensinamentos debatidos.
Mas os tempos estavam a mudar. Tinham já descartado o Evangelho de Maria Madalena, o seu papel de apóstola mais querida transformado no de primeira prostituta, todas as mulheres eram a encarnação do mal de uma Eva pecadora que come e dá a comer o fruto da perdição e os homens da Igreja relegavam a palavra e o saber das mulheres para as catacumbas da valia. Nesse mundo misógino, uma mulher do calibre de Hipátia não tinha lugar. No mundo que se construía, o seu papel de farol do conhecimento e de primazia sobre os homens que a ouviam e respeitavam, era um anacronismo.
Com a destruição da Biblioteca de Alexandria e o incêndio que queimou quase todos os livros que aí se reuniam, tirando um pequeno grupo menor que se guardava num anexo secundário, perdeu-se uma fatia de conhecimento inestimável. Até hoje, não se sabe o que se perdeu e o tanto de séculos necessários para outros serem retomados. A perda desse conhecimento andou a par da subalternização do papel feminino, pouco mais do que escravas dai em diante, sem direito a aprenderem a ler e a escrever, impedidas de pensarem.
Do fim da Biblioteca de Alexandria e da morte de Hipátia, nasce o período das Trevas, dos livros fechados em conventos, dos homens analfabetos educados apenas no manejo das armas e da morte, dos factos adaptados ao mito, das ideias adaptadas à verdade única teologal decretada em Concílios, da escuridão da prisão de não poder pensar.
O que Cirilo começou foi um mundo de retrocesso sob o punho de uma religião que se estendia e levava os seus valores e os seus dogmas, bem como os medos de homens menores que não queriam perder o domínio sobre as mentes e sobre o saber para assim melhor controlarem os seus rebanhos. O que Cirilo começou não acabou sequer para as mulheres no século das Luzes e nem aí o pensamento de metade da população do mundo encontrou lugar e direito. Até hoje, por esse mundo fora, há Hipátias silenciadas, escondidas sob véus, fechadas em casas, sem direito a opinião ou pensamento livre, sem poderem dispor de si mesmas e do seu direito a pensarem. O que Cirilo começou fez com que, mesmo no mundo ocidental do feminismo finalmente assumido e sutiãs queimados e quotas pro-igualdade, continue a ser uma batalha diária ver o saber feminino tido em conta sem um olhar condescendente. O que Cirilo começou, faz com que até hoje – e talvez o filme de Amenabar finalmente o corrija – o nome de Hipátia seja desconhecido.
Quando, em 2004, escolhi o nick Hipátia para assinar as minhas opiniões no mundo dos blogues, pensei que seria reconhecido como aquilo que representava: o nome de uma mulher pagã, uma das maiores cientistas de que há memória. Pensei que na blogosfera, um sítio que era então dominado por um punhado de gente relativamente privilegiada, com acesso rápido ao google e com vontade de escrever o que, quase sempre, indica pessoas que gostam de ler e de saber mais e mais coisas, o nome da Hipátia não fosse nem novidade nem sem significado para a maioria. Estava enganada. Enganada ao ponto de descobrir com espanto que nem a pronúncia correcta de Hipátia era sabida, que tinha de explicar que não rimava nem com simpatia nem com mania, que não era óbvio nem quem tinha sido nem o que representava.
Foi isso que Cirilo começou antes de ser canonizado. Foi isso que prevaleceu até hoje: mesmo quando os nomes da antiguidade clássica se tornaram referência e debatidos e estudados pelo mundo que queria voltar ao conhecimento perdido e retomar a Luz após a Idade das Trevas, ainda assim Hipátia ficou esquecida. Será que a esqueceram porque o seu conhecimento era menor do que o dos homens que ensinou ou dos que lhe pediram opinião e conselhos? Ou terá ficado esquecida por ser mulher?
2009-12-25
Bowlling?
«Uma mulher conseguiu ontem saltar as barreiras de segurança colocadas na Basílica de São Pedro antes da Missa do Galo, tendo derrubado o Papa Bento XVI, que não ficou ferido no incidente. Menos sorte teve o cardeal francês Roger Etchegaray, de 87 anos, que estava junto ao Sumo Pontífice e que também caiu, tendo fracturado o osso do fémur.»
in O Público
.
(...)
(Mesmo no meio da fartura e da alegria, há fantasmas que voltam todos os Natais. Os meus fantasmas queridos e o tanto que lhes sinto a falta em cada mesa de consoada).
2009-12-23
2009-12-22
Tive uma prenda!
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Ah se eu fosse prendada como tu! E achei que a letrinha só inclinava para o mesmo lado, ainda para mais para o lado de cima. Não me parece mau de todo.
Obrigada!
Perfume? Qual perfume?
2009-12-21
Pagã
2009-12-20
2009-12-19
Do género
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Há tantas vezes em que parece que as mulheres não passam do degrau da equivalência. E há tantas outras em que parece que, para atingirem o topo, tiveram que adoptar comportamentos estereotipados do sexo oposto. E há ainda tantos anúncios da menina da bilha… E até sabemos que podemos e devemos dizer tudo, fazer tudo, sem cobranças, para além das tantas que já fazemos diariamente a nós mesmas. De saltos altos, na maioria dos dias, para que ninguém esqueça que há nisto tudo uma certa dose de masoquismo. Com horário completo para além da hora e sem nunca um nove às cinco, que ainda há a casa, o supermercado, o jantar e os filhos. Uma geração de super-mulheres de quem se espera que façam tudo e tudo bem. Mas o pior, o pior mesmo, é quando – depois de longas e estudadas análises racionais a todos os conceitos, todos os deveres e todos os direitos – acabamos a sentir que não nos livramos do preconceito. Trazemos ainda o gajo tatuado em nós, é marca de fogo, letra escarlate. Em nome dele, julgamo-nos e ainda somos capazes de, no fim, julgar a outra. Talvez seja tudo uma questão de falta de hábito no jogo em equipa, dessa inconcebível capacidade do bicho macho para se proteger e ressalvar a gregaridade do género. Nós vamos logo de faca na mão e língua afiada e a vizinha tem sempre qualquer coisinha de que podemos dizer mal com inusitado fulgor. Depois, como somos nós que acabamos a parir a todos, géneros à parte, passamos no leite o que somos e o que ainda não conseguimos chegar a ser. E é por isso que, mesmo esperando pelo dia milagroso em que o Mundo seria, finalmente, governado pelo desgoverno feminino, feito de palavras e conversas, em lugar de murros e bombas, temo-o com igual desgarre: que faremos umas às outras nesse dia, se não gostarmos dos sapatos, ou invejarmos o vestido? E que reservaremos para as putas, aquelas que, sendo-o ou não, caíram para o lado debaixo da forma viciosa como ainda olhamos para o nosso género?
2009-12-18
Pa rum pum pum pum
aqui
Interne-se!
aqui
2009-12-17
...
2009-12-16
E depois há este
2009-12-15
Apre!
aqui
Estava a precisar
2009-12-14
Da vaidade
aqui
2009-12-11
2009-12-10
Dos retalhos
Foi-se tudo
como areia fina escoada pelos dedos.
Mãe! aqui me tens,
metade de mim,
sem saber que metade me pertence.
Aqui me tens,
de gestos saqueados,
onde resta a saudade de ti
e do teu mundo de medos.
Meus braços, vê-os, estão gastos
de pedir luz
e de roubar distâncias.
Meus braços
cruzados
em cruz de calvário dos meus degredos.
Ai que isto de correr pela vida,
dissipando a riqueza que me deste,
de levar em cada beijo
a pureza que pariste e embalaste,
ai, mãe, só um louco ou um Messias
estendendo a face de justo
para os homens cuspirem o fel das veias,
só um louco, ou um poeta ou um Cristo
poderá beijar as rosas que os espinhos sangram
e, embora rasgado, beber o perfume
e continuar cantando.
Mãe! tu nunca previste
as geadas e os bichos
roendo os campos adubados
e o vizinho largando a fúria dos rebanhos
pela flor menina dos meus prados.
E assim, geraste-me despido
como as ervas,
e não olhaste os pegos nem as cobras,
verdes, viscosas, espreitando dos nichos.
De mão nua, entregaste-me ao destino.
Os anjos ficaram lá em cima, cobardes, ansiosos.
E sem elmos ou gibões,
nem lutei nem vivi:
fiquei quieto, absorto, em lágrimas
— e lá ao fundo esperavam-me valados
e chacais rancorosos.
Mãe! aqui me tens,
restos de mim.
Guarda-me contigo agora,
que és tu a minha justiça e o exílio
do perdido e do achado.
Guarda-me contigo agora
e adormece-me as feridas
com as guitarras do fado.
Mas caberá no teu regaço
o fantasma do perdido?
Poema Cansado de Certos Momentos, Fernando Namora
aqui
Serras, veredas, atalhos,
Estradas e fragas de vento,
Onde se encontram retalhos
De vidas em sofrimento
Retalhos fundos nos rostos,
Mãos duras e retalhadas
Pelo suor do desgosto,
Retalha as caras fechadas
O caminho que seguiste,
Entre gente pobre e rude,
Muitas vezes tu abriste
Uma rosa de saúde
[refrão]
Cada história é um retalho
Cortado no coração
De um homem que no trabalho
Reparte a vida e o pão
As vidas que defendeste,
E o pão que repartiste,
São lágrimas que tu bebeste
Dos olhos de um povo triste
E depois de tanto mundo,
Retalhado de verdade,
Também tu chegaste ao fundo
Da doença da cidade
Da que não vem na sebenta,
Daquela que não se ensina,
Da pobreza que afugenta
Os barões da medicina
Tu sabes quanto fizeste,
A miséria não segura,
Nem mesmo quando lhe deste
A receita da ternura
Retalhos da Vida de Um Médico, José Carlos Ary dos Santos
2009-12-09
A carta
aqui
O ano foi quase todo mais do mesmo, como de costume. E, como de costume, fui uma menina bem comportada.
Já sei que este ano estou outra vez atrasada, Pai Natal e a carta, assim em cima da hora, é capaz de tornar difícil a prenda no sapatinho. Mas é que, como todos os anos, Novembro só me tem trazido as más notícias e os sopapos e até parece que, mesmo sendo eu uma menina tão bem comportada, o destino vai dando uma folga durante o resto do ano para depois melhor me apanhar de surpresa.
Deve ser por isso que este ano não me apetece nem um Ralph, nem um Gerard, nem sequer paciência. Assim, Pai Natal, este ano só te peço uma coisa: podes apagar Novembro do calendário?
Maria Hipatia Ludovina da Silva, uma menina bem comportada