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Olho à volta e penso em como o populismo gratuito se vai tornando cada vez mais rasca e se entopem todos os sinais de fait divers em lugar de se discutir o que realmente importa. Acabo a pensar que talvez um dia destes nos apareça um qualquer grande ditador orweliano (um verdadeiro, em lugar de um fabricado à guisa de papão). E a eloquência, essa veemência mesmerizadora, também pode ser mera cortina de fumo, uma cantiga de sedução. Temo mesmo que estejamos prontos para ser enrolados num qualquer cenário de admirável mundo novo, já que as épocas de crise (económica, sociológica, ética…) são pródigas em experiências políticas. Pior, que o aceitemos já, protestando talvez, mas nada fazendo para o evitar. A preguiça e o individualismo são grilhetas atrofiantes. E um dia o rebanho desata a correr e leva tudo à frente, enquanto renuncia ao imprescindível em nome de um qualquer valor deificado capaz de anular todos os valores reais. E não penso sequer que as mudanças sejam bruscas e que, de um momento para o outro, o mundo esteja completamente diferente. As mudanças serão passo a passo, lentas e progressivas: a cada dia se tolera mais uma perda, vai-se um bocadinho de dignidade, desbarata-se outra réstia de cidadania. Lentamente, para que ninguém se revolte enquanto se enrola num qualquer novelo de maravilhas e desejados por vir. É sempre assim o futuro, mesmo quando há revoluções. Ou retrocessos civilizacionais.
4 comentários:
Essa da falta de ética é redundante: a sua persistente inexistência só é conhecida quando vem à ribalta. E tantas que não veio nestes últimos 35 anos...
Antes, um homem dava a sua palavra e a palavra valia como um contrato firmado na presença de testemunhas; um aperto de mão era um selo; a honra media-se pela ética. Ainda há gente assim, mas vai sendo cada vez mais rara. E não tenho dúvidas - muito para além da política, ou da justiça, ou do jornalismo, ou de... - que a ética entrou em crise especialmente com a nossa geração. Rica merda que temos armado à nossa volta! Mas 35 anos? Não sei se são assim tantos: os tecnocratas da treta também precisaram sair dos cueiros e os ex-fedelhos da vida fácil ainda não estavam à frente deste naufrágio anunciado.
Rstes tempos andam mesmo bons para um Adolfo ou um José Estalinho. E não é só aqui no cantinho, em toda a europa, acho eu...
(e quanto à ética, bom, bom...)
Tempos de crise dão sempre origem a ideias mirabolantes. E a alguns "salvadores da pátria" de cantiga afinada. O pior é quando se ouve a música e se vai atrás, na velha lógica do Gaiteiro de Hamelin. O precipício onde caem os ratos é que não me parece que tenha mudado.
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