2007-01-31

O Nim do Prof. Marcelo


aqui

Aliás, só nos conseguimos lembrar, assim de repente, de duas pessoas com esta certeza no cagar: O professor Marcelo e o professor Saraiva que (carago!), quando ele diz "D. Afonso Henriques arreou o calhau precisamente atrás desta árvore!", di-lo com tanta convicção que nem o mais pintado se atreve a duvidar.

Já todos viram os Gato Fedorento. Eu também. Mas também há este post lá na Padaria.

2007-01-30

Livre-arbítrio


aqui

Toda a alegria silenciosa de Sísifo aqui reside. O seu destino pertence-lhe. O seu rochedo é a sua coisa.

Albert Camus – O Mito de Sísifo

A fé - ou a crença, pelo menos - nunca conseguiu motivar-me e, nas palavras dos outros, quem esteve mais perto de se constituir na minha verdade pessoal foi, sem dúvida, Camus. Ainda hoje acredito que podemos transformar a nossa "coisa" em Esperança. Só não sei como. E, por isso, deixo que o calhau role encosta abaixo todos os dias para, mais uma vez, tratar de o empurrar encosta acima na manhã seguinte.

Não tenho em mim sede de verdades teologais, nunca deixei de olhar para elas com suspeita. Temo como facilmente, ao tentarmos passar para além do que temos - esse real pequeno e limitado onde sabemos agir e reagir -, podemos facilmente desculpabilizar os actos. Daí até aos actos serem praticados em nome de um qualquer absoluto, vai um passo de formiga.

Não haverá nunca a paz de um "seja o que Deus quiser" para mim; o acaso é apenas isso, a motivação é apenas nossa, a responsabilidade deveria apenas cair sobre as nossas cabeças.

E por mais que tente, tanta vez, ser acutilante nas verdades que defendo, não consigo imaginar um mundo em que faça sentido obrigar todos os outros a assumirem as minhas verdades como as únicas, sem direito a livre-arbítrio que é, como qualquer pessoa que não queira mais do que um qualquer dogma bafiento sabe, bem diferente de qualquer tipo de libertinagem ou arbitrariedade.

A liberdade é feita de escolhas. A responsabilidade é nossa. As consequências serão apenas mais um calhau.

Preciso de uma página nova

É que há ainda mais :)

Há também um link na lateral, junto com os outros desafios da Voz.

(Os textos novos continuam a ficar no topo do post sem que os queira hierarquizar. Apenas por uma questão de comodidade na leitura. )


Era só isso


Era só isso. Um atrasar de passo, que os teus são mais longos que os meus, um parares ao pé de mim, exactamente ali, naquela esquina. E, sem eu te dizer, perceberes porquê. Tu saberes que eu não resisto ao apelo da terra, tu entenderes que eu preciso de parar para absorver as coisas, para as tornar minhas. Saberes que preciso de ir devagar para levar os cheiros, as cores, os gestos, os pormenores comigo. Tu saberes que me demoro a olhar a sombra do meu pé antes de o pousar no chão, a contar com os olhos os tufos de flores rebeldes no relvado cuidado do jardim, elas que se recusam a não florir ali, e que são como eu, que não me resigno. Tu saberes qual é a minha cor de céu preferida e que é aquela do fim do dia, um azul meio turquesa, meio petróleo, e Vénus a piscar para mim, às vezes a lua já a espreitar. Tu saberes que gosto do teu braço à minha volta, e de encostar a cabeça a ti enquanto caminhamos. E tu parares comigo ali, naquela esquina, de uma rua qualquer, a sentir o primeiro cheiro da primavera num fim de tarde de Março, para o levarmos connosco para casa. A nossa casa. Era só isso, era só isso que eu queria.

Rosmaninho - 2006-03-14

P’amor de Deus!


17 milhões de embalagens de anti-depressivos consumidas em Portugal?

Criem um blogue!

Cap
- 2004-10-21
O Polvo

Ela odiava despedidas. Talvez porque tivesse participado em muitas. Habituara-se, todavia, a desligar-se desses momentos. O importante era não manter o contacto visual. Dar um último beijo com o coração de fugida. Virar as costas. Ir em frente. Nunca olhar para trás.

E agora, agora, ele estragara-lhe anos de treino em despedidas custosas. Ela ia apanhar o comboio depois do reencontro. Mais uma despedida. Talvez esta custasse mais que todas as outras. Estava abraçada a ele. Tinha um envolvimento forte e intenso. Tentou desprender-se de um braço e já lá estava outro. Mais um para tirar e depois mais outro. Parecia estar ligada aos braços dum polvo que nunca mais a queriam largar.

Precisava desligar-se para sofrer menos. Mais um beijo. Sentia a quentura da pele dele na gelidez do adeus. Precisava de voltar à independência do seu corpo, mas ele fundia-se cada vez mais nela. A tristeza crescia pelas suas entranhas. Ficou de coração oprimido a tentar sair dos braços daquela paixão em forma de polvo.

Ele olhava-a nos olhos, abraçava-a, sussurrava-lhe palavras de amor. Ela falava do presente que devia ser vivido mas não conseguia parar de pensar, de se projectar naquele futuro sem ele, sem o seu corpo, sem o seu abraço do qual queria fugir e ao mesmo tempo refugiar-se para sempre…
Finalmente, chegou o comboio. Um último beijo. Virar as costas. Ir em frente. Nunca olhar para trás. Nunca olhar para trás. Nunca olhar para trás…

De olhos secos , alma lacrimejante, viu-o partir pela janela…

Jacky - 2005-12-30
Correntezas de incertezas várias, fumadas por favor, que eu gosto

Desafios, diz o
Bagaço, depois de desafiado pela Divas, formas comuns de correntes, uma forma adulta de brincar ao verdade ou consequência, que acaba sempre por nos sair um poucochinho cara, pois de qualquer beco e esquina logo há-de aparecer o Lobo mau, e com o hálito bestifero vosso conhecido, mirra de imediato qualquer palha que se digne e se esmifre por se manter armada em palha encostada a tantas outras palhas a quem chamaram casebre. E a propósito de palhas, e de palhetas, o que eu gosto de palhetas acompanhadas ou não por caracoletas, não escargots que se comem com um garfo estúpido, e depois perde-se o gozo do molho a escorrer por entre os dedos, alojando-se em meia circunferência na parte posterior da camisola, mas até te ris, que depois de umas cervejas até te estás mesmo a preocupar com a porcaria do molho que já escorre em cascata ensopando aquela parte das calças a que chamam boca de sino quase tão mau como os sapatos de sola à barco.

Pausa para respirar…

Dizia eu do desafio um género de desfolhada, prima da palha, protegem-se os alérgicos, que o vento anda de bailarico algarvio a moer o pedúnculo ás folhas, daquelas que a minha filha apanha grandes parras cor de mel, e poisa cuidadosamente no tablier e diz: - São para ti, mãe. E eu sempre que a olho nestas alturas, só lhe recordo os pés ervilha encostados no meu xifoideu, o hálito quente com cheiro de amêijoa a embranquecer-me a sobrancelha, e o ventre macio globuloso que se arrepia ao fresco das minhas mãos.

Ia eu nos desafios…

Já volto. Vou só ali só ver se os dois gajos estão tapados, que o tempo arrefeceu e já me pediram o edredão, mas eu lá sei que se hão-de destapar, que as hormonas são um bichos ferozes que trepam pelo peito acima da canalha e, os põe destapados até ao abdómen liso e seco de quem cresceu depressa demais e eu quase nem tive tempo de me sentar a ver.

Com licença.

JP
- 2006-09-22

Selene
(à minha filha)

Era o travo do meu pão a saber-te a pouco e tu a amassares com raiva uma massa tenra já crestada. Ou nem por isso mas simplesmente porque esmurram a farinha e saltam e se soltam, as crias, quando chega o dia.

Era um gosto gasto, insisto. E a ira colada às tuas asas com sonhos de Ícaro.


Era o casario da beira-mar a chamar-te para o centro e tu em desejo de sair do labirinto na vertical, por sobre as águas do rio e sem pontes.


Era o atrito das coisas próximas a faiscar e eu a subir em vão os degraus para te travar na torrente bruta das palavras. Sem te alcançar. Sem nos vermos frente a frente por ser nas costas que eu carregava o fardo cujo peso dobrei em culpas.


Era a tesoura a cortar o fio das mãos esticadas que se tocavam ainda ao de leve mas a medo.


Era a solidez no desafio dos olhos, heranças minhas; pão de mistura com travo a passado firme, pronto a enfrentar o dia novo, na vertical, mas repousando aos poucos na ponte que tecemos de uma margem até à outra.


Elipse - 2006-11-08

In Fraudem Legis

Primeiro quis vendar-me os olhos. E eu, no uso da capacidade de gozo dos meus direitos, achei que o patrocínio das partes, que ele tanto apregoava, tinha todas as possibilidades para dar origem a uma ratificação no mínimo à altura do órgão competente. Era tudo uma questão de pró rata.

A definição das coordenadas fundamentais da posição de cada um deixava-me a braços com os fundamentos do direito. Tinha-se constituído, pois, a situação ideal para verificar a constitucionalidade da matéria formal, adiada vezes sem conta por falta de comparência da minha parte.

Incisivo – dizia ele – podes crer!, nunca menos do que isso!

Para mim incisivo era assim tipo curto e grosso; mas… in dubio pró réu, pois os meus preconceitos são facilmente contornáveis quando se trata da análise detalhada do corpus. Parto sempre daí, como manda a metodologia de qualquer recherche.

Mas eu conto: a insistência aguçou-me a curiosidade, embora o nosso conhecimento tivesse ocorrido numa situação chata: foi na altura do meu primeiro divórcio e ele teve aquela atitude paternalista do homem que, viciado na tutela dos mais fracos, achou que devia bater-se pelo habeas corpus, dando um murro na secretária quando lhe disse que a outra parte ansiava pelo contencioso.

Desde então ficou sempre pendente entre nós uma promessa de deveres recíprocos, mas ele tinha-se queixado de uma disfunção intestinal e eu, na altura a braços com merda suficiente para me atolar, ad cautelam, não dei azo ao trato proposto, até porque me fartei daquela conversa do direito potestativo. Não sou de ficar à espera que os braços de um homem me protejam das agruras da vida. Coitados, nem o direito patrimonial lhes confere a autonomia que uma mulher traz à nascença, quanto mais uns braços deontologicamente estatuídos.

Mas a minha curiosidade mata-me. Aquilo da concepção contratualista da sociedade fez eco durante uns tempos, até porque não sendo eu mulher de coacções, quando me ponho sobre a matéria não descanso enquanto não vou até ao fundo.

Aceitei, pois, ficar de olhos vendados. Mal sabia ele que estava a alimentar um dos meus fetiches. Oh deuses… até me senti desfalecer ante a perspectiva da aplicação do direito, assim em animus jocandi. O que depois me meteu raiva for a pega que ele me pôs na mão, associada a um tilintar de ferros. Sujeitei-me à contra ordenação e, ex abrupto, tirei a venda, não fosse o doutor estar à espera de uma violentação com base na matraca.

Uma balança? Para que queria ele que eu segurasse a balança? Teria dúvidas sobre o peso da sua matéria orgânica? Seria alguma regra de conduta sancionada e promulgada pela Ordem? Um modus operandi que eu desconhecia? É que há gente que, de tão normativa, consegue perder o sentido do gozo dos seus direitos! Que natureza social seria a daquele indivíduo, ali de joelhos no chão, a pedir-me sigilo ainda antes de iniciar a sessão.
Meto-me em cada uma!

De olhos esbugalhados encarei a caducidade da coisa como uma afronta e, sem apelo nem agravo, disse-lhe que não havia acórdão que resistisse a tamanha humilhação. A dele, porque para mim foi apenas mais um fracasso para a minha colecção...

E saiu-me, assim de rompante, ipsis verbis, esta chave de ouro: “olhe, querido, ponha a sua capacidade jurídica num dos pratos da balança que eu ponho a minha capacidade de gozo no outro. Vai ver qual de nós terá de ir à procura de um órgão mais competente!”

Fausta Paixão - 2006-10-27

A solução final!

José estava farto da vida!
Um dia resolveu enforcar-se numa árvore. Esta, estava tão seca que o ramo quebrou.
Depois José atirou-se para a frente de um camião. Nada. Travou a tempo!
Tentou com uma pistola. Encravou.
Pediu ajuda a um amigo. Este recusou.
Experimentou com veneno. Estava fora do prazo, ganhou uma valente dor de barriga.
Estava desesperado! Tinha de encontrar uma solução infalível.
Ligou a televisão, estava a ver o noticiário. Foi aí que viu a escuridão ao fim do túnel. Era isso! Não ia falhar!
Saiu, entrou no automóvel, e conduziu em direcção ao norte.
Ao fim de algum tempo, chegou ao seu destino final. Na praça central de Felgueiras a agitação era geral. José foi-se entranhando na multidão.
Quando estava bem no centro, gritou com toda a força que lhe restava: Quero que a Fátima se foda!!!

O enterro é amanhã, às 15.30, na igreja do Bonfim.

Patologista - 2005-09-22




Madrugada

E é quando chegas a desoras, por entre os espaços que a noite tece ao abrir-se à madrugada, que nasce um calafrio na minha espinha. Começa breve, no cós das costas, que para estas coisas as costas são um espaço com costura.

Sobe lentamente, como que dedilhado, imprecisa-se por entre os gumes da minha pele arrepiada. É quase como um sopro, ou um suspiro. Tem sabor e cheiro, tem tacto. É um ir e vir subtil, um ensaio quase geral a que falta a música.

Chega a saudade por entre as primeiras luzes da manhã, levanta os lençóis e aloja-se junto. Abraça-me e ficamos lá as duas.

Mas estou fria, sozinha, enrodilhada na vontade de te ver chegar a desoras, para me abraçares o corpo pelas costas, fazeres com as mãos ninho no meu peito e me despertares o corpo e os sentidos.

Comprimo-me assim contra o vazio feito lembrança. E ainda te sinto o cheiro a limão e baunilha, com laivos de maresia. Sabor agridoce, como lágrimas sorridas. Ou o toque da distância, quando a saudade me vem acordar, neste imperfeito chegar de coisa alguma.

Um fado de te sentir sem te ter verdadeiramente, sempre a desoras, como as luzes da madrugada ou os primeiros raios de sol, que não me aquecem, enquanto brilham sobre a minha pele nua.

Hipatia
- 2006-04-19




(Leiam também os que estão no outro post.)

2007-01-29

Dalinesco


Spellbound


Não tenho nada. Absolutamente nada. Nada, senão um miserável molusco enrolado entre as suas duas conchas. Que não quer pôr a cabeça de fora. Medo das bombas, suponho. Mas sei que estou a mentir a mim próprio. Na realidade, o meu quarto está apinhado de gente. Rebenta pelas costuras. À volta da minha cama erguem-se espectadores em sentido. E não são uns espectadores quaisquer! Toda uma panóplia de sandinistas, cubanos, moís, satarés, em pêlo ou fardados, empunhando as suas bestas ou as suas kalachnikov, acobreados como estátuas, aureolados de poeira gloriosa. E têm uma bela tusa, os fulanos! E, de mãos nas ancas, montam-nos uma sebe de honra densa, tensa, arqueada, que me corta a respiração.

Daniel Pennac – O Paraíso dos Papões


De que coisas se fazem os pesadelos?

2007-01-28

O Irão já está a arder?

THE BEST WAR EVER -- by John Stauber & Sheldon Rampton


O nosso problema está antes numa situação em que o Império Americano não sabe o que quer nem o que pode fazer com o seu poder, nem quais são os seus limites. Limita-se a repetir que quem não está com ele, está contra ele.

Eric Hobsbawm - Tempos Interessantes


Já não tenho hoje qualquer dúvida de que Bush ficará para a História como uma espécie de Nero pós-moderno: uma figura menor e minguada mas, até por causa disso, profundamente perigosa.

2007-01-26

À conta do histerismo


(infelizmente, a mãe deste não abortou)

Na 2, num qualquer programinha manhoso que eu, mesmo não querendo, ajudo a pagar, alguém apresentava um punhado de células e dizia: "se a mãe tivesse abortado, Beethoven não nascia".

E fico para aqui a pensar na quantidade de defensores do Não que, quando já não há mais argumentos e porque até sabem bem que o está em causa é despenalizar a mulher e não dizer sim ao aborto, reclamam do histerismo dos defensores do Sim.

Histerismo do Sim? Quando se passeiam santinhas grávidas do lado do Não, se promete a excomunhão, se fala em terrorismo e em pena de morte? Histerismo do Sim? Mas têm mesmo a certeza?

É que, visto deste lado, sei bem onde pára o histerismo. Vejo-o quase todos os dias em prime-time ou até meio escondido num canal que todos pagam. Vejo-o em out-doors falaciosos. Vejo-o em comentários imbecis de pessoas que até tenho por inteligentes.

Que vos parece? A imagem e comentário ali em cima são suficientemente histéricos? Pareceram-me bem, à conta da treta do Beethoven…

2007-01-24

Quem espera desespera



aqui

Hoje, por duas vezes, duas pessoas diferentes fizeram-me lembrar esta resposta que um dia dei ao Espumante:

Uma mulher vai à casa de banho e precisa passar pelo espelho. Aproveita, vê o batom; depois vê também as olheiras e que tal está o cabelo. De seguida - enquanto vai falando da vizinha do andar de baixo com a amiga que, necessariamente, a acompanha - espera que uma casa de banho fique vaga. Finalmente lá aparece uma. A mulher entra. Inspecciona a sanita. Vê se há papel. Nunca há. Abre a mala e procura os lenços de papel. Porra! Ficaram no carro. Esvazia a mala para os bolsos para ver se não haverá um lenço de papel perdido. Não há. Esvazia os bolsos para a carteira. Encontra um lenço de papel no fundo do bolso. Volta a pôr a mala pendurada no cabide. Abre as calças, baixa as calças, baixa os collants, baixa a cueca. Faz equilibrismo sobre a sanita, mantendo em média 5 cm entre o corpo e a borda do vaso. Tendo uma bexiga mais pequena do que a masculina (porque há muito mais coisas a ocupar espaço "do lado de dentro") é com alívio que começa a urinar. As pernas começam a ficar cansadas da posição. Finalmente acaba. Usa o lenço de papel. Procura o balde do lixo. Não há balde do lixo. Deita para dentro da sanita o lenço. Levanta a cueca. Baixa novamente a cueca porque o pensinho diário ficou enrugado. Sobe a cueca. Sobe o collant. Sobe as calças. Fecha as calças. Ajeita a roupa toda e ainda dá mais um arranjo ao collant no dedo grande do pé esquerdo. Foda-se! Acabou de rasgar o collant. Tira o verniz da mala e põe no collant para evitar que a malha alastre. Espera que seque o verniz. Calça o sapato. Guarda o verniz. Abre a porta e sai em direcção ao lavatório. Vê o cabelo. Vê o batom. Vê as olheiras. Tira os anéis todos. Guarda-os no bolso. Lava as mãos. Não há papel para secar as mãos, só aqueles secadores horríveis que não secam nada. Grita pela amiga "tens um lenço de papel?". A amiga grita de volta "usei o último agora". Seca as mãos às calças. Enfia os anéis. Volta a arranjar o cabelo e compõe o batom. Sai finalmente do WC linda e espampanante, sem ter molhado a sanita e de mãos bem lavadinhas, porque as mulheres lavam SEMPRE as mãos e é aí que desperdiçam um tempo precioso.

E obviamente que é sempre um tempo de merda. Especialmente para quem espera e não há mais nenhum wc livre.

2007-01-23

Ui!

Sex Bomb


Um bocadinho de calor num dia muito frio…

…ou o meu elogio aos homens que me fazem rir às gargalhadas.


(O facto de ter feito sku na calçada portuguesa na primeira vez que calcei saltos em ano e meio não tem nada a ver com isto. Obviamente!)

2007-01-22

Perpétuas


Joana Fomm como Perpétua

É o que eu digo, deixam-nas ir à escola, aprender coisas mais para além de saber conferir os trocos na mercearia, e é o que dá. Daí a nada estão a trabalhar, usar calças, viajar sozinhas, a viver em pecado com homens, a tomar a pílula e a dizer que não querem isto e aquilo porque pensam assim e assado. Umas terroristas. E eles não lhes ficam atrás, os malandros, que os há por aí que até gostam destas mulheres arraçadas de homem, jasus.

I.
, em resposta a este post.

Hoje vi uma Perpétua na televisão à hora de almoço. Estava em tempo de antena com formato de notícia, vermelhusco e cheio lá das suas razões. Vestia sotaina e tudo... Mas só me lembrou a irmã da Tieta que, depois, quando fomos a ver, tinha um grande segredo escondido no armário…


Novela Tieta - Perpétua Voando


(...mas eu sempre tive uma imaginação desbragada…)

2007-01-21

Patetas?


aqui

Volta e meia, lança-se novamente a discussão sobre nicks, nomes, como se faz opinião na blogosfera e se este é ou não um sítio de liberdade. Li ao AdamastoR algures que a blogosfera apenas é livre quando assinada por pseudónimos (o que é muito diferente do anonimato) pois só assim o autor – ao não ter de temer qualquer tipo de represália – pode de facto expressar uma opinião descomprometida.

Claro que para quem gosta de panelinhas e jogos de poder, deve ser muito indigesto ter de conviver com pseudónimos. Claro que é mais fácil tentar manter nos blogues os mesmos tipos de espartilhos do que fica "lá fora". Claro que é mais fácil…

Dar o nome pode significar muito ou pouco. Conheço muita gente que assina com nick e de quem sei o nome e quase tudo o mais que vem atrelado ao C.V.. Como também há muita gente que me conhece o nick e também o nome e o C.V., sendo que alguns sabem que sabem e, outros, nem sequer desconfiam.

Mas quando escrevo com um nick quero crer que sou livre. Livre de dar uma opinião, de expressar um argumento. Livre para estar na blogosfera só porque sim, sem ter de fazer publicidade ao que sou fora daqui, sem tentar encontrar por aqui mecanismos paralelos de auto-promoção, com vista a lucros prováveis a partir de objectos bem mais tangíveis do que um simples post que, rapidamente, se perderá nos arquivos.

E é por me sentir tão livre que, sem falsas modéstias, às vezes me sinto até melhor: não necessito espalhar boatos, nem sequer usar a boa-fé e a humanidade que, felizmente, ainda não se perderam de todo em muita gente, para promover fins "estranhos".

Não gosto de ver interesses tão abertamente a nu, tão expostos, depois de lhes seguirem o rasto e detectarem os objectivos. Não quero sequer saber se é deontologicamente correcto, ou ético. É antes por uma questão de lealdade e de franqueza. Podem dar quantos nomes quiserem e publicarem on-line quantos C.V. quiserem: os
patetas não são os que acreditam, na sua infinita boa-vontade; são os que se aproveitam assim da boa-vontade que ainda existe.

Estrelinha que te guie!


aqui

Ouvi ontem parte do discurso de Hugo Chávez em que ele se referia à morte eminente de Fidel Castro, dizendo que El Comandante está outra vez na Sierra Maestra. Mas o Fidel nem vai nem fica… E, bolas, para além do torpor com que fico ao imaginar que já há herdeiro para os discursos de dez horas, só me ocorre mesmo pensar como está demorada a partida. Não haverá um cantinho no Inferno para fazer uma revolução?

(e nem me venham com tretas: não é por ser de esquerda que este não é tão mau como os outros)

2007-01-19

A propósito...





... sabiam que até a Lolita é tolerável?

Eu cá não perco o Scoop nem por nada :))

Coisas que não percebo


aqui


Coexistirem, no mesmo País, uma intenção de manter uma lei (que até os que a defendem dizem que não é para cumprir) para proteger as criancinhas que hão-de vir e uma visão tão estrita da legislação que não dá qualquer garantia de protecção às crianças que já há.

2007-01-17

Aviso:


aqui


Por motivos de força maior que nada têm a ver com a scarlettmania recorrente do macho blogger cá da urbe, hoje abre-se neste tasco uma excepção de carácter anual (no máximo dos máximos) e põe-se aqui a fulaninha.

Parabéns,
Miguel!

2007-01-16

Em resposta ao desafio

Já há mais :)

(Os textos novos ficarão no topo do post; não que os queira sequer hierarquizar. É apenas por uma questão de comodidade na leitura. Todos sabemos como os olhos nos fogem nestas páginas, não é?)


Síndroma Bridget Jones


De entre tantas heroínas cinematográficas inesquecíveis, capazes de mover mundos só com um pestanejar, suscitar paixões arrebatadoras à beira da loucura, de personalidades fascinantes e misteriosas, protagonistas de tramas e intrigas Shakespearianas, tinha logo de me identificar com a muito longe de perfeita da Bridget Jones!

Desde a primeira cena do filme, em que Bridget canta esganiçadamente uma canção da não menos esganiçada Celine "tou-a-gritar-assim-pra-vocês-perceberem-que-tenho-um-aparelho-vocal-potentíssimo" Dion, ressacada, desgrenhada e entre beatas de cigarros que logo senti uma enorme empatia com aquela personagem tão humana.

Continuando o filme fui-me revendo vezes sem conta em várias situações, principalmente na lei de Murphy que se verifica sempre no azar e falta de timing que a acompanha. Imagino-me nas situações embaraçosas, como chegar a uma festa de máscaras com uma completamente despropositada* porque ninguém se lembrou de avisar, ou a falar descontroladamente devido a verborreia nervosa despoletada por situações de stress agudo e uns copos a mais.

E lembro-me de mim, a espetar-me numas escadas enquanto tentava um ar sensual e acenava a um tipo que achava interessante, a ter um furo às 5 manhã no meio da auto-estrada no único dia do ano em que resolvi vestir mini-saia e saltos altos, ou encontrar o gajo que minutos antes entrou sem querer na casa de banho das mulheres, enquanto me equilibrava na típica posição gaja-em-casa-de-banho-pública, a contar animadamente o sucedido aos meus amigos, sentado no meu lugar na mesa. Não há charme que resista!

Mas se até uma Bridget, histérica compulsiva de cuecas à mãe com padrão de leopardo encontrou o seu príncipe encantado da camisola de lã com renas oferecidas pela avó nem tudo está perdido. Até porque a Julieta morreu e a Scarlett acabou sozinha, parada no tempo à espera do amanhã.

*Só duvido que alguma vez me mascarasse de coelhinha da Playboy, já que costumo adoptar posturas mais low profile – aliás todas as amigas da minha mãe passam a vida a aconselhar-me a andar mais descascada “Ai filha, se tivesse esse corpinho andava sempre de mini-saia”, para ver se arranjo homem, disfarçando mal a preocupação de que fique para tia no avanço dos meus 25 anos.

Luna - 2005-02-28



Dança de Palavras...


Não mais a ti direi que meus olhos estão tristes.Que as palavras abafam na penumbra do meu peito.Palavras gastas de tempo de memórias, ilusões perdidas de mundos que se foram.Não mais a ti direi que o sentido é sentido, que o abraço é viver no sangue, a chama da saudade…Que todas as marés que percorri em palavras, trazem a odisseia de quem as viveu.E como dizia o poeta “… gastam-se as palavras…” mas não se gasta o íntimo pensamento, partilhado unicamente a duas mãos, em danças de luas, que não se repetem.

Bailam as folhas, bailam lentamente…

Em céus azuis de sonhos sofridos, de esperanças renascidas de sorrisos em meu rosto…

Silêncio...estou sozinha...eu me desnudo
Manifestando a dor, sem disfarçá-la...
E por adormecê-la e suavizá-la,
A noite envolve a terra, qual veludo!

...e as palavras correm como vento.

...O vento atrai tempestades, esse vento da noite, que derruba estrelas, vento que gela por vezes o meu corpo, vento de ira, vento que transforma um pequeno grão de areia, em pedra dura... vento que sempre volta, para lembrar a saudade e avivar a dor...vento que enlouquece a tempestade que se adivinha, nas ondas gigantescas deste mar que é a Vida.

Na dança... soltam-se lembranças…

...viajei no tempo das minhas memórias. Não que tenha saudades desses tempos. Nada disso. Mas voltar ao passado, lembrar amores e desamores, fortalece o meu espírito. Sempre gostei de assumir, perante mim própria, tudo aquilo que a Vida me dá. De bom e de mau. Nem tudo foram rosas, mas nem tudo foram espinhos. Já viajei em águas revoltas, já rompi madrugadas orvalhadas de lágrimas e suspiros. Mas também já vi o sol nascer, de sorriso rasgado, corpo molhado de prazer. Fui ao fundo das minhas memórias, sorri e voltei.
Hoje - estou feliz!

Diluem-se pensamentos…

A ti me dou em forma de palavras.
Para que nos teus sentires despertes os meus.
E nessa paixão que nos enlaça
Um poema satisfazemos...
Um poema...
Este poema mágico que sentimos dentro de nós...
As tuas palavras com que saboreias a minha alma...


Lavam-me a alma…

E se há uma estrela, além, marcando-nos o destino,
é esforço vão fugir ao perigo dum momento!
E se uma folha move - foi em pensamento -
Sacudida por Deus.
Não é livre o caminho...
...de quem as proferiu…


Rosa Brava - 2007-01-13

Aborto


1º Sou contra o aborto! sempre fui.
2º Sou a favor da legalização do aborto! sempre fui.
Parece contraditório, mas não é.

Toda a gente é contra o aborto. Mesmo as mulheres que conheço que já abortaram, por decisão, são contra o aborto. Por princípio.Assim o principal argumento do NÃO deixa de ter razão. Os NÃO dizem que são pelas crianças que estão para nascer (somos todos).

O aborto sempre foi proíbido em Portugal e isso nunca fez com que abrandásse. É proíbido, mas continua-se a fazer. De que serve o argumento do NÃO de continuar a proíbir se, se vai continuar a fazer? De que tem servido proíbir? Mas respondam! De que tem servido?

E não me venham com as consultas de planeamento familiar. Na minha zona, em dois anos, o centro de saúde já teve a pílula esgotada por três vezes. E o que dizem às mulheres é, para voltarem dentro de oito dias. Já grávidas, concerteza.

E não me venham dizer que os serviços têm de melhorar, porque é óbvio que têm, mas até lá continuarão a fazer-se muitos abortos.

É bom que percebam, os homens principalmente, que há mulheres que não se dão bem com a pílula e que os outros métodos contraceptivos são ainda mais falíveis. E que há também que "descansar" da pílula e aí, mesmo usando outros métodos contraceptivos, é a desgraça completa. A maior parte das mulheres engravida. Há um terror generalizado em fazer o "descanso".

Os NÃO pensam, pelo menos parece, que se o aborto fôr legalizado haverá mais mulheres a fazê-lo; falam como se elas o fizessem por gosto. É falso. As mulheres quando o vão fazer já o pensaram dez mil vezes, já se arrependeram outras dez mil, não vislumbram saída, traumatizadas por terem de o decidir, fazem-no em desespero.

Não estão a brincar, são adultas, são mães (a maior parte dos casos), são conscientes.

Cuidado com os julgamentos, porque de todas as classes sociais, de todas as "educações" e de todos os credos já o praticaram. Com que direito se recusa áquelas que já o fazem, mesmo sendo proíbido, dignidade e condições médicas. Ou pretendem já castigá-las em terra em nome de uma moral, ou de um qualquer deus?

O castigo não é prender, o castigo tem sido pior: morre para aí porque não mereces melhor, e se sobreviveres que fiques com a saúde arruinada é o que te desejo. E às poucas que só ficam traumatizadas, por fim prendem-nas.

Não tenham a mínima dúvida que é isso que a sociedade pensou, disse e fez quando respondeu NÃO ao referendo anterior.

É esta a minha declaração de voto.

Marta - 2006-09-29


Mapa

O teu corpo um mapa onde solitária mergulho
corpo que se acende em mim, vive e transborda
e cada letra do abcedário uma chave
tu o cofre, mapa que percorro com as mãos quentes
tentando adivinhar-te onde te dói mais o grito
e no meu olhar cresce o brilho
em todas as carícias te encontro
e cabes inteiro nas minhas mãos cheias
talhados que fomos à medida do encontro
e caibo inteira ns tuas mãos cheias

Das pontas dos meus dedos nascem asas
contorno-te a boca de desejo num voo
difusos os sentires no corpo suado
sexo palavra breve
breve
completa

Vague - 2005-02-28


"Forgive Father, for I have sinned. It's been 30 years since my last confession."


Chamava-se Manuel. Devia ser novo ainda na altura, talvez trintas e tantos, alto, bem-parecido, simpático, acessível, sempre disponível e bom ouvinte e ainda por cima, Padre. Todos gostavam do Padre Manuel, novos e velhos, era disputado pelas famílias influentes para os jantares, recorriam a ele para tudo, opinião ou obra, nunca tanto se fez na freguesia inteira, nunca tanto bailarico se organizou, nunca houve tanta moça disponível para catequizar ou fazer a limpeza da sacristia ou paramentos.
O meu primeiro filme projectado vi-o no salão paroquial. Depois de uma festa qualquer que meteu farto almoço, seguiu-se a exibição de uma fita. Seria de esperar que escolhesse uma qualquer coboiada, mas não, escolheu O Rapaz dos Cabelos Verdes de Joseph Losey.
Também na hora da confissão podíamos contar com ele. Estar à espera em silêncio, a ensaiar a lista de pecados, era angustiante. Depois entrava-se na sacristia, ele estava à espera, sorria.
"Então, conta lá...." Puff, mente em branco, gaita, nem um pecadinho, ai rápido, alguma coisa.....
"... aborreceste a tua avó?" Sim! Isso, isso...!
"... não a ajudaste em casa?" Exactamente!
"... não tens estudado nem feitos os trabalhos da escola?" Mais, mais....
"... e disseste palavras feias?" Merda! disse merda!
Saía uma tonelada de cima, ele sabia tudo de cor e salteado, conhecia-nos por dentro e por fora e garantia uma safa divina! Que mais se pode pedir de um padre aos 7 anos? Mas nada se mantem eternamente na mó de cima e o estado de graça do Padre Manuel não era diferente. Espíritos mesquinhos começaram a espalhar frases maldosas aqui e ali, quem conta um conto acrescenta um ponto e num ápice passou de santo a cruxificado na praça pública.
A gota de água veio na forma de uma criança a quem o Padre Manuel deu o seu nome. Escândalo, escárnio, maldizer, ouro sobre azul para a cambada de hipócritas ingratos e de memória curta que conseguiu assim expulsá-lo da freguesia com o amém dos superiores hierárquicos. Foi enviado algures para os subúrbios de Lisboa, onde aparentemente não fazia diferença ser padre perfilhador de crianças.
Ele foi o primeiro e último padre com P grande que conheci e marcou a minha primeira desilusão com a Igreja. Não sei o que foi feito dele, se continuou a espalhar a "palavra de Deus" com o entusiasmo contagiante que o caracterizava e arrastava tudo e todos. Espero apenas que não seja só amargura o que sente quando ocasionalmente se lembrar de nós.

Uxka - 2005-05-25

Teóricas e práticas


Ele era inexcedível quando se atracava a mim e subia uma mão por dentro da camisola até fazer saltar um seio do soutien para os dedos titilarem o mamilo enquanto a outra se metia desvairadamente pelo cós das calças ou da saia, na ansiedade de um bando de pássaros migradores a bicarem cada milímetro das zonas húmidas.A gaita, Senhor Doutor, era quando naquele período do aquecimento se empenhava em fazer do meio das minhas pernas o seu prato de leite que era uma pressa de schlep, schlep, tal e qual os gatos fazem com a língua. Eu bem sei que os filmes pornográficos são um fraco material de apoio para esta questão já que a maior parte das vezes são gajas com gajas e nenhum mânfio as vai copiar, não vá perder virilidade por isso e, quando são gajos na função, aquilo é mais estética para o plano que outra coisa qualquer.O facto é que a falta de comunicação emitida em gemidos da minha parte o fez repensar a questão e a solução que encontrou foi pegar no popular passar o corredor a pano e, literalmente, fazer de mim chão de esfregona. Oh Senhor Doutor, eu nem queria acreditar, dada a sua idade cronológica que o sexo oral fosse para ele matéria virgem mas em boa verdade, ainda me irritava mais a sua contínua falta de espírito de investigação.E assim, fartinha do trivial que era o que a minha avózinha chamava às refeições dos dias de semana, resolvi fazer-lhe um desenho e pespeguei uma imagem de um
pénis e de um clítoris nas minhas nádegas que era o expositor que tinha ali mais à mão e paulatinamente, pedi-lhe que observasse bem as semelhanças que permitiam que as técnicas de sucção aplicadas num pudessem ser igualmente aplicadas no outro, tal como o contorno a língua no topo da elevação e que, de igual modo, as mãos colocadas na base permitiam a aceleração do estado de erupção.Só não lhe disse mesmo que me parecia que o pénis era uma evolução natural da espécie clitoriana para não lhe criar um crise de identidade e consequente demissão de quaisquer funções.

Maria Árvore - 2006-01-23


O terceiro mês

As cartas são várias ao dia, os telefonemas também. Ela levita, ele suspira, ela acha-o o homem mais completo que já conheceu, ele acha-a a mulher mais extraordinária que já conheceu, ela diz que ele a faz sentir-se uma mulher melhor, ele fala-lhe das melhorias que ela tem provocado nele, ela tem vontade de partilhar tarefas domésticas com ele, ele tem vontade de a trazer para a sua casa, ela pede aos pássaros junto da janela dele para cantarem na madrugada do seu aniversário, ele tem vontade de aprender a cozinhar receitas só para ela, ela diz-se alucinada, ele diz-se nas nuvens, ela canta-lhe ao ouvido "nunca me deixes", ele quer ajudá-la nos dias bons e nos maus, ela diz que vai com ele para todo o lado, ele ganha horas e dias de vida, ela agradece ao seu Deus por a deixar estar ao lado dele, ele diz que a traz dentro de si a toda a hora, ela diz que nunca encontrou ninguém com quem desejasse tanto partilhar o mundo e os dias, ele sente-se feliz por esta mulher gostar dele, ela tem medo que ele não espere e desista, ele garante que não o fará, ela diz que tem quase a certeza de que vão ser felizes ao lado um do outro, ele também, ela adora-o indubitavelmente, ele adora-a serenamente.

A perspectiva que se tem das coisas é substancialmente alterada consoante o contexto e os sentimentos envolvidos. Ambos têm o seu passado, que os faz querer tomar cautelas, dar um passo calmo de cada vez. Pequenas ousadias com confiança. Dizem-no um ao outro. E concordam. Mas a realidade é que não resistem à vertigem, como se viu pelos excertos que lhes roubámos no parágrafo anterior. E acabam por se entregar mais do que desejariam tendo em conta as condicionantes, sentindo a vulnerabilidade que daí resulta. Só mais tarde poderão perceber com maior clareza a velocidade com que tudo aconteceu. E lembrar que quanto mais depressa se sobe, mais depressa se desce, embora o soubessem todo o tempo. Só que não tinham forças para segurar a avalanche.

Mas estou a adiantar-me, porque afinal temos aqui um cavalheiro prestes a encetar uma longa viagem, decidida há minutos. Ela não tem a certeza de ser a melhor opção nesta data, mas também não sabe se algum dia terá essa certeza. Por isso ele vai.

E ao encontrarem-se as palavras quase desaparecem. Falam primeiro os braços que envolvem tudo. Falam as mãos que procuram tudo. Falam as bocas que devoram tudo. Durante horas nesta noite, haverá momentos imperfeitos uns, mais saboreados outros. Vão-se conhecer os detalhes dos rostos, as formas dos dedos, as texturas da pele, dezanove pulseiras de prata, as cores da roupa que não se vê. Vai haver um sono abraçado, sorrisos partilhados, palavras em voz baixa. De um lado há quem queira dar tranquilidade, do outro há quem queira ensinar a sorrir mais. Ambos querem viver o presente sem promessas, mas aqui e ali saem palavras que falam mais de futuro do que desta noite, porque nem sempre se controla o que se quer e o que se diz.

Existem duas maneiras de ver os efeitos de um primeiro encontro nos moldes em que este aconteceu. Por um lado há quem diga que agora ainda vai ser mais difícil a distância. Por outro lado pode-se argumentar que ao consumarem-se os gestos e se perceber a realidade do outro se perde a magia da idealização. Só que não vai haver tempo para descobrir se algum destes mecanismos entrará em acção. A verdade é que nos dias seguintes houve acontecimentos na vida dela que os ultrapassaram.

Como se dirá daqui a uns anos naquela nova arte que vai nascendo agora, a realidade morde. E morde-lhe as canelas sem dó, puxa-a para baixo da sua levitação e trá-la de volta a todas as condicionantes e dificuldades do dia a dia. Não vou explicar ao leitor do que se tratou, o caro amigo terá de me fazer fé.

Nestas semanas de Maio ele vai tentando à distância dar o apoio que sabe e pode. Nem sempre acertará no melhor modo, porque afinal se conhecem ainda pouco e há pouco, principalmente em situações de crise. E sobretudo por faltarem os olhos nos olhos e os abraços que podem ser bem mais úteis do que palavras nestas horas. Pouco a pouco vão rareando os telefonemas, ele continua a escrever as cartas, vai recebendo uma de vez em quando. Ela diz que não o merece e que teme que ele se desiluda. Ele aceita tudo e mantém-se ali. Até quase já não ter resposta.

Sendo um homem confiante que não desiste ao primeiro obstáculo, soube continuar a remar sozinho. (e esta confiança era das coisas que a ela mais lhe aprazia) Sendo um homem pragmático que consegue distanciar-se de si para analisar as situações, soube depois parar de remar ao ver que o barco ia vazio.

Foi então neste início do quarto mês, o de Junho, que li uma última vez a carta mais extensa e sentida que me enviaste, (e que entretanto já perdeu o perfume) voltei a dobrá-la segundos antes de se dar o cliché das letras borratadas e pestanejei para clarear a visão. Arrumei a carta no fundo da gaveta, arrumei-te a ti no fundo da memória. Com um sorriso dos que me ensinaste.

Jorge - 2006-06-07

Obrigada!

eheheh


aqui

A Luna vale por mil outdoors!

2007-01-15

Um desafio…


aqui


E se eu vos pedisse para me dizerem qual foi o post que mais gostaram escrever e mo deixassem trazer aqui para a Voz?

Já vos pedi tantas vezes palavras, em troco de um qualquer motivo, que me atrevo agora, sem mote, a pedir-vos que escolham nos vossos arquivos as palavras que mais gostaram de ver contra o fundo do vosso blogue.

É um exercício da vossa e da minha memória. E mais um pedaço vosso aqui na Voz que, já tantas vezes, se fez mais vossa que minha casa.

No entretanto, vou aos meus arquivos também. Ainda outro dia o
me lembrou como a distância e o tempo podem fazer maravilhas sobre a forma como apreciamos o que escrevemos. E agora gostaria de vos levar a uma descoberta igual.
____
Os resultados estão:

Parabéns, PN!

Portishead - Roads

A verdade é que nem escolhemos, mas às vezes é impossível não se gostar de alguém. É quase uma empatia natural, um dar de caras e pensar que está-se bem, cool, este vai. E, sim, quando se passa das palavras e da net até aos olhares, às vezes não há espaço para desilusões, só encontros imediatos com vozes bonitas, tenrinhas, simpáticas. E deve ser por isso que, apesar de andar o menino tão longe dos afectos que espalhou por aqui - sim, que nós gostamos mesmo de ti, porra! - não posso deixar de dar os parabéns ao PN.

Parabéns, menino da voz bonita. Foi bom - muito bom! - voltar a ouvir-te. Toma beijo.




2007-01-13

(...)


Ulla Lima González - Trompas de Falopio




Todas as palavras têm o seu contexto, mas algumas transmitem ideias que me deixam a pensar noutras coisas. Como estas, da Elipse. E questiono-me até que ponto seria legítimo, caso a despenalização da IVG (que espero) avance, propor para as mulheres que recorram sistematicamente à IVG uma laqueação de trompas… Ai está uma pergunta à qual votaria sim sem quaisquer reservas, mesmo que seja um cercear de direitos quando grande parte da minha luta pelo sim à despenalização da IVG tem exactamente um objectivo oposto: dar direitos, sem criminalizar.

2007-01-12

Doces horas


O sexo dele aponta agora a Norte, fazendo eco dos retalhos de desejo partilhado e das formas exóticas que os gestos dela têm sempre para lhe despertar os sentidos. Ela brinca e ri, excitada, meia despida pelos dedos convulsos dele, coquete e feminina. Brinca com o corpo dele, brinca com o próprio corpo, aproxima-se e afasta-se... E por cada novo jogo, pela antevisão da audácia dela ao fazê-lo quase sofrer pela espera, ele sente o sangue correr acelerado, como a água das cheias de Inverno a galopar por entre o negrume da terra antes ressequida. A pele dela, branca como uma tela ainda virgem, parece pedir que os dedos, a boca, a língua dele, a preencham de cores quentes e de suor. E ele tem cada vez mais urgência naquela petit mort prometida, aquela morte santa de onde renasce cheio de vida. O espelho do quarto devolve-lhe a visão dos dois corpos entrelaçados e o gume erguido do seu pénis endurecido, pedra agora, polvilhado de pequenas pérolas opalinas. E sente que o vício de tê-la não está ainda saciado e, logo pela manhã para que o dia amanheça radioso, esperará que aquela voz sussurrada lhe marque o encontro, como de costume, nos degraus do coreto do meio do jardim onde um dia marcaram o primeiro encontro para um simples café sem açúcar. E as horas anunciadas são doces assim…



(Já
sabes que sou incapaz de resistir a um bom mote. Pode não ser nem conto, nem poema, mas estão lá as palavrinhas todas...)

2007-01-11

5 anos!


aqui

Preâmbulo

Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo;

Considerando que o desconhecimento e o desprezo dos direitos do homem conduziram a actos de barbárie que revoltam a consciência da Humanidade e que o advento de um mundo em que os seres humanos sejam livres de falar e de crer, libertos do terror e da miséria, foi proclamado como a mais alta inspiração do homem;

Considerando que é essencial a protecção dos direitos do homem através de um regime de direito, para que o homem não seja compelido, em supremo recurso, à revolta contra a tirania e a opressão;

Considerando que é essencial encorajar o desenvolvimento de relações amistosas entre as nações;

Considerando que, na Carta, os povos das Nações Unidas proclamam, de novo, a sua fé nos direitos fundamentais do homem, na dignidade e no valor da pessoa humana, na igualdade de direitos dos homens e das mulheres e se declararam resolvidos a favorecer o progresso social e a instaurar melhores condições de vida dentro de uma liberdade mais ampla;

Considerando que os Estados membros se comprometeram a promover, em cooperação com a Organização das Nações Unidas, o respeito universal e efectivo dos direitos do homem e das liberdades fundamentais;

Considerando que uma concepção comum destes direitos e liberdades é da mais alta importância para dar plena satisfação a tal compromisso:

A Assembleia Geral

Proclama a presente Declaração Universal dos Direitos do Homem como ideal comum a atingir por todos os povos e todas as nações, a fim de que todos os indivíduos e todos os órgãos da sociedade, tendo-a constantemente no espírito, se esforcem, pelo ensino e pela educação, por desenvolver o respeito desses direitos e liberdades e por promover, por medidas progressivas de ordem nacional e internacional, o seu reconhecimento e a sua aplicação universais e efectivos tanto entre as populações dos próprios Estados membros como entre as dos territórios colocados sob a sua jurisdição.


As roupas mudaram de tom, as fotografias agora são a cores… Mas um campo de concentração não deixa de o ser só porque a cosmética e a retórica da “liberdade” (que não há) e da “democracia” (de que fizeram tábua rasa) de um alucinado Tio Sam e os seus apaniguados dizem que sim.

2007-01-10

Memória


aqui

Não sinto nunca que sei muito seja do que for. Sei um bocadinho mais da área em que me formei e, no entanto, evito conscientemente falar dela. É como se não fizesse qualquer sentido estar para aqui a debitar matéria, um arrazoado sem interesse para a maioria e sem espaço para ficar limitado ao corpo de texto de um post. Sei muito pouco de quase tudo, mas guardo na memória um amontoado de conhecimentos sem interesse. Talvez eu seja o estilo de pessoa para responder às perguntas do Malato: debito informação guardada, sem a questionar, indo buscá-la a qualquer espaço da memória que faria melhor se ficasse livre para informações realmente pertinentes. Gostaria, por exemplo, de guardar mais facilmente nomes, coisa que não acontece. Chego a irritar-me profundamente por recordar toda uma série de factos circunstanciais, que vou debitando para o interlocutor, num esforço para que, do outro lado, venha o nome que me foge. Sei pormenores que não interessam, mas não lembro o essencial. Tenho facilidade para guardar pormenores, como palavras que já quase ninguém usa e que, na verdade, apenas me fogem para as teclas quando escrevo. Esqueço caras também. É como se não houvesse espaço para elas. Aliás, esqueço pessoas por completo, se não fizeram de alguma forma marca na minha vida. Não sou nada boa para aquelas conversas do tipo "o irmão do primo da Maria, casado com a Engrácia, que era aquela da sala ao lado quando estávamos no 9º ano e tinha uma vespa azul às risquinhas". Perdia-me logo no primo. Nunca chegaria à Engrácia e à sua vespa. Jamais lembraria o irmão. Coisas de memória selectiva, mas não selectiva o suficiente. Preferia uma memória mais funcional, menos cheia de informações sem interesse. Dava jeito lembrar caras. Dava jeito lembrar nomes. Dava muito jeito saber como excluir do meu disco rígido tanta informação sem valor real para o que faço todos os dias. Dava jeito saber como armazenar tudo o que se prova fazer falta, especialmente na interlocução social e que, há muito, mandei para os arquivos mortos da memória. Tenho uma memória de caca a precisar de um upgrade

2007-01-09

Presumíveis culpados?

A GNR-BT, nos auto-stops, começou a fiscalizar os CD's piratas que temos no carro.


Como é que, em menos de uma hora, recebi cinco forwards de um e-mail que me avisa para tirar possíveis cópias de CDs que tenha no carro, porque o lobo mau polícia pode ver e apreender-me a viatura?… Mas está tudo doido? Alguma vez a polícia pode meter a unha dentro da minha propriedade privada sem mandato das instâncias competentes, i.e., um tribunal? Mas será que já ninguém sabe que direitos tem e como os reclamar?

Nenhum polícia de nenhuma operação stop pode tocar no que é meu e esteja dentro do meu carro. Até a porra do triângulo tenho de ser eu a desencantar da mala.

A presunção de inocência ainda não é letra morta, bolas! E o direito à propriedade privada continua a existir.


(Desculpem lá o desabafo irritado; sei que o fizeram com a melhor das intenções. Mas nenhum agente da polícia pode presumir alguém culpado de um crime de pirataria só porque viu um cd dentro de um carro, com ar de cópia. Os agentes da lei não presumem; cumprem a lei. Até aquela que existe para nos proteger dos abusos de autoridade.)

Miragem


Mg Lizzi - Reflecting drops

Chega o sopro à violência da marca e os lábios tatuam-se na pele. É ferrete de dono, ou o anúncio da partida. É estigma da distância, nódoa de ausências. É este trazer-te ainda, impresso na pele, impregnado na jugular. Como se não quisesses que partisse ou eu, na vontade de ficar, desse o pescoço aurido à grilheta da saudade.

2007-01-08

Caracolinha sempre nova :)


Mirna Alonso - Estructura de Caracol

Parabéns, menina!

Incontornável

David Bowie heroes


I, I wish you could swim
Like the dolphins, like dolphins can swim
Though nothing, nothing will keep us together
We can beat them forever and ever
We can be heroes, just for one day

Oh I, I will be king
And you, you will be queen
Though nothing, nothing will drive them away
We can be heroes, just for one day
We can be, yes, it's just for one day

I, I remember
Standing by the wall
The guns, they shot above our heads
And we kissed, as though nothing could fall
And the shame was on the other side
Oh, we can beat them, forever and ever
Then we could be heroes, just for one day

We can be heroes
We can be heroes
We can be heroes
We can be heroes, just for one day

O Ziggy faz hoje 60 anos...