Brand new friend
A brand new friend…
Lloyd Cole – Brand New Friend
Talvez exista uma predisposição dos portugueses para ouvir quem canta a alma. Talvez seja uma questão cultural. A pop levezinha e sem conteúdo nunca fez muito sentido. Ouve-se. Dança-se. Esquece-se. Mas os cantautores guardam-se. Estimam-se. Preservam-se.
Ontem estava a ouvir o Josh Rouse e a pensar na minha assolapada paixão adolescente pelo Lloyd Cole. Tinha catorze anos quando ouvi o homem pela primeira vez ao vivo. O Jennifer She Said fazia sucesso nas rádios e, no entanto, eu sabia que não era bem uma moda que desapareceria com o tempo e com o fim da adolescência. Não era só por achar o homem lindo. Não era só por ser uma pop eighties. Havia ali mais. Eu só não sabia o que era.
Lembro-me de pensar que o homem podia rapidamente desaparecer da memória de todos mas que ficaria na minha. Eu entendia as letras. Mesmo que o meu inglês não fosse grande coisa na altura. Mas eu entendia. Eram sentimentos facilmente reconhecidos. Eram a alma a nu. E somos todos demasiado parecidos nas nossas esperanças, nas nossas frustrações, nas nossas inseguranças, nos nossos sonhos. Ele limitava-se a pô-los nas palavras certas e musicados.
Depois sempre houve no Lloyd Cole aquela atitude muito pouco star, ou VIP, ou o que se quiser. Aquela mania de alguns – quando se tornam famosos – para olharem de cima para quem lhes compra os discos, quem os ouve, quem os segue. Conheci-o a partilhar um copo com o público depois de um concerto. A interessar-se verdadeiramente pela opinião de quem com ele falava. A sorrir e a esforçar-se por falar português. E fez ainda mais sentido ouvi-lo cantar. Porque no quente da voz e no quente das palavras, estava também uma personalidade simpática e quente.
E é esta atitude que sinto no Josh Rouse também. Nos sorrisos, na maneira como enche o palco, assumindo que só se ele conseguir tirar prazer do que está a fazer os outros terão prazer ao vê-lo actuar. E enche o palco de forma confortável. Como um amigo ou o vizinho do lado. Canta palavras que entendemos, sentimentos que também são nossos. Leva-nos numa viagem que talvez tenhamos já também percorrido e só não sabemos ainda como a cantar.
Já não tem aquele bigode absurdo nos cantinhos da boca. Está mais magro. Parecia ter acabado de acordar. Acendeu o cigarro que estava a apetecer a todos os fumadores. Gostou da acústica. Acho que também gostou de ver o público e de sentir que o público estava a gostar de o ver a ele.
Há uma magia nos cantautores. Parecem vizinhos do lado ou amigos. Cantam coisas que fazem sentido, coisas que também já vivemos. Cantam a alma deles que, no fim, acaba por ser parecida com a nossa. E é por isso que os levamos para casa e os ouvimos anos a fio. É por isso que os seguimos, vamos aos concertos e esperámos impacientes para lhes comprar os trabalhos novos.
Não envelhecem. Ou, às tantas, envelhecem a par connosco e por isso não ficam datados. Continuam a fazer sentido. Continuam a pertencer ao grupo restito de pessoas a quem convidaríamos para um jantar em nossa casa para fazer do ritual de um jantar íntimo, a eternidade onde as almas têm espaço para se encontrarem verdadeiramente, na forma de um poema, de uma música, de uma história…
(Só lamento que ontem não tenha havido um milagre.)
A brand new friend…
Lloyd Cole – Brand New Friend
Talvez exista uma predisposição dos portugueses para ouvir quem canta a alma. Talvez seja uma questão cultural. A pop levezinha e sem conteúdo nunca fez muito sentido. Ouve-se. Dança-se. Esquece-se. Mas os cantautores guardam-se. Estimam-se. Preservam-se.
Ontem estava a ouvir o Josh Rouse e a pensar na minha assolapada paixão adolescente pelo Lloyd Cole. Tinha catorze anos quando ouvi o homem pela primeira vez ao vivo. O Jennifer She Said fazia sucesso nas rádios e, no entanto, eu sabia que não era bem uma moda que desapareceria com o tempo e com o fim da adolescência. Não era só por achar o homem lindo. Não era só por ser uma pop eighties. Havia ali mais. Eu só não sabia o que era.
Lembro-me de pensar que o homem podia rapidamente desaparecer da memória de todos mas que ficaria na minha. Eu entendia as letras. Mesmo que o meu inglês não fosse grande coisa na altura. Mas eu entendia. Eram sentimentos facilmente reconhecidos. Eram a alma a nu. E somos todos demasiado parecidos nas nossas esperanças, nas nossas frustrações, nas nossas inseguranças, nos nossos sonhos. Ele limitava-se a pô-los nas palavras certas e musicados.
Depois sempre houve no Lloyd Cole aquela atitude muito pouco star, ou VIP, ou o que se quiser. Aquela mania de alguns – quando se tornam famosos – para olharem de cima para quem lhes compra os discos, quem os ouve, quem os segue. Conheci-o a partilhar um copo com o público depois de um concerto. A interessar-se verdadeiramente pela opinião de quem com ele falava. A sorrir e a esforçar-se por falar português. E fez ainda mais sentido ouvi-lo cantar. Porque no quente da voz e no quente das palavras, estava também uma personalidade simpática e quente.
E é esta atitude que sinto no Josh Rouse também. Nos sorrisos, na maneira como enche o palco, assumindo que só se ele conseguir tirar prazer do que está a fazer os outros terão prazer ao vê-lo actuar. E enche o palco de forma confortável. Como um amigo ou o vizinho do lado. Canta palavras que entendemos, sentimentos que também são nossos. Leva-nos numa viagem que talvez tenhamos já também percorrido e só não sabemos ainda como a cantar.
Já não tem aquele bigode absurdo nos cantinhos da boca. Está mais magro. Parecia ter acabado de acordar. Acendeu o cigarro que estava a apetecer a todos os fumadores. Gostou da acústica. Acho que também gostou de ver o público e de sentir que o público estava a gostar de o ver a ele.
Há uma magia nos cantautores. Parecem vizinhos do lado ou amigos. Cantam coisas que fazem sentido, coisas que também já vivemos. Cantam a alma deles que, no fim, acaba por ser parecida com a nossa. E é por isso que os levamos para casa e os ouvimos anos a fio. É por isso que os seguimos, vamos aos concertos e esperámos impacientes para lhes comprar os trabalhos novos.
Não envelhecem. Ou, às tantas, envelhecem a par connosco e por isso não ficam datados. Continuam a fazer sentido. Continuam a pertencer ao grupo restito de pessoas a quem convidaríamos para um jantar em nossa casa para fazer do ritual de um jantar íntimo, a eternidade onde as almas têm espaço para se encontrarem verdadeiramente, na forma de um poema, de uma música, de uma história…
(Só lamento que ontem não tenha havido um milagre.)
1 comentário:
On : 12/20/2004 4:45:07 AM Caliope (www) said:
estás com um leve toque nostálgico :-)
On : 12/20/2004 12:36:43 PM Hipatia (www) said:
Estava Às vezes dá-me para isso
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