Nas velhas histórias, de maneiras diferentes, chega-se sempre a um ponto em que os deuses deixam de partilhar a sua vida com os mortais e estes morrem ou desaparecem. Saem do palco e deixam-nos sozinhos, tropeçando nas nossas falas. É este traço mitológico que torna madura uma civilização: um mundo em que os deuses deixam de brincar connosco e de nos dominar e de seduzir as nossas mulheres e de utilizar os nossos exércitos para resolver as suas brigas sifilíticas à custa do sangue dos nossos filhos; um mundo de que os deuses se retiram, ainda enraivecidos, ainda priápicos, ainda enigmáticos, (…) deixando-nos livres para fazermos o melhor ou o pior sem a sua intervenção autocrática.
Salman Rushdie – O Chão Que Ela Pisa
Esquecemos muito vez que a mesma mão que segura uma arma, também segura a mão de um filho; que a boca que profere palavras de ódio, também é capaz da ternura de um beijo; que os olhos que se escondem por trás de uma mira assassina, também se podem encher de lágrimas…
Esquecemos muita vez que o bem e o mal estão em cada um de nós, à flor da pele. Esquecemos que, numa civilização que demitiu os deuses, só nos cabe a nós encontrar o caminho, para além de todas as lutas intestinas, todas as brigas sifilíticas que continuam a derramar o sangue dos filhos da Terra.
Há novidades em Israel, finalmente: mais um massacre, sem história, enquanto novos jogos políticos semeiam pequenas sementes de esperança que podem fazer História. Que se demitam os deuses também: já chega de fazer deles culpados das lutas fratricidas pelo poder, o domínio, a terra e o que mais for possível idolatrar.
Salman Rushdie – O Chão Que Ela Pisa
Esquecemos muito vez que a mesma mão que segura uma arma, também segura a mão de um filho; que a boca que profere palavras de ódio, também é capaz da ternura de um beijo; que os olhos que se escondem por trás de uma mira assassina, também se podem encher de lágrimas…
Esquecemos muita vez que o bem e o mal estão em cada um de nós, à flor da pele. Esquecemos que, numa civilização que demitiu os deuses, só nos cabe a nós encontrar o caminho, para além de todas as lutas intestinas, todas as brigas sifilíticas que continuam a derramar o sangue dos filhos da Terra.
Há novidades em Israel, finalmente: mais um massacre, sem história, enquanto novos jogos políticos semeiam pequenas sementes de esperança que podem fazer História. Que se demitam os deuses também: já chega de fazer deles culpados das lutas fratricidas pelo poder, o domínio, a terra e o que mais for possível idolatrar.
2 comentários:
É sim senhor :)
Beijo
On : 12/20/2004 4:46:49 AM Caliope (www) said:
Os deuses não resultarão de uma necessidade humana? ;-) É possível... Resta a fé :-)
On : 12/20/2004 5:05:12 AM Marta (www) said:
Não sei se melhora...
Obrigada pelas tuas palavras no meu blog. Resolvi voltar. Beijo
On : 12/20/2004 12:46:56 PM Hipatia (www) said:
Estava a pensar no quanto acho parecidos israelitas e palestinianos, dois povos que usam e abusam de questões de fé para legitimar o ódio e as ganas de poder, de terra, de domínio. A uns cabe a posição de domínio, cheios de armas novas e tecnologicamente eficientes, alimentadas pela especulação americana; aos outros sobram as pedras e pouco mais, escorraçados de direitos e de privilégios por parte dos senhores do Mundo. E, no entanto, são semelhantes em muita coisa; são povos irmãos desde a nascença. Nas atitudes, nas mentalidades de alguns, são irmãos siameses. Só se escondem atrás de um Deus diferente. Se é preciso demitir os Deuses para que uma civilização encontre a maturidade, então talvez esteja na hora de se encontrar um percurso laico para o túmulo a céu aberto em que se vai transformando a Palestina. Não sei se pode continuar a haver necessidade de fé na religião, ou, pelo menos na religião organizada. Terá que se aprender a ter antes fé no Homem, desde que o Homem saiba prescindir desses tais deuses que não se cansam de mandar os seus filhos para a guerra e para os caminhos do ódio.
Beijinhos
On : 12/20/2004 12:52:54 PM Hipatia (www) said:
Também não sei se melhora, Marta. Há demasiados hábitos velhos e ódios novos; demasiados interesses escusos; demasiada especulação. Mas saber que o governo de direita de Israel terá de entrar em negociações com os moderados parece-me um progresso, ainda assim. Mesmo que, mais uma vez não dê em nada...
E ainda bem que estás de volta. Há coisas que, de tão pequeninas, tão pobres, tão mesquinhas, nunca nos deveriam fazer desistir.
Beijinho grande
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