2009-04-24

Salazar


aqui

Luz recortada nesta manhã fria
Muros e portões chave após chave
O meu amor por ti é fundo e grave
Confirmado nas grades deste dia


Sophia de Mello Breyner Andresen - Caxias 68



Deram-lhe nome de largo e acho bem. Que se pise aquela calçada com vontade. E que haja cães a cagar-lhe os cantos. E que por lá, em algum dia, alguém continue a lembrar que existiu. Que foi. Que até tem nome de largo. Para que a memória não enfraqueça e os cães não deixem de lhe cagar em cima. E as gentes de lhe calcar a calçada. E que fique lá o nome, já só memória, para que apenas memória sobre. Antes isso do que fazer de conta que não foi e aproveitar o tempo para lavar a História. Ou abusar, agora que já tanto tempo passou, de palavras que definham nos sentidos. Como o tanto que se grita por censura e por fascismo, hoje que não há grilhões nem algemas e até há um largo.

4 comentários:

cereja disse...

Hipatia, minha querida, que grande post.
Um abraço muito grande e muito apertado. Eu falei do caso mas sem esta força, de um modo mais trocista, quando o que era preciso era isto que aqui disseste!!!

Hipatia disse...

Em Santa Comba Dão engessaram-me uma vez um pé. E não ficou particularmente bem engessado. Adiante. Porque é mesmo adiante, que ninguém se lembra que existe aquela terra nos dias normais e duvido que alguém sequer se dê ao trabalho de lá ir ver o largo. Deixem o engravatadinho lá do sítio ter os seus 15 minutos à conta da polémica que quis gerar plantando a lápide (lápide até que está giro; lembra-me que o velho das botas está morto e enterrado) a 25/04 no meio de porco assado ou lá o que é e restantes porcarias. É que o engravatadinho só o faz e pode fazer porque o velho já não existe (e como a terra deve estar-lhe a ser bem pesada, agora que até virou estrela de soft-porn nacional! Isso e a lápide em cima). É só mais um largo a que ninguém vai dar importância, como tantos outros largos com tantos outros nomes a que não se dá nenhuma importância. O que importa é que o velho está morto. E seu regime também. E hoje temos engravatadinhos. E esses engravatadinhos é que são os tais que só querem 15 minutos – e nunca terão quase meio século – porque não passam disso mesmo: moscas coladas à merda, a ver se ainda lhes sobra para o jantar. Que não tentem é lavar a história. E que não tentem é abusar de palavras que vão perdendo (e felizmente) os seus significados, que ainda há gente viva que as sentiu na pele. É que não adianta a um engravatadinho escolher palavras vazias e discursar cheio de peito para a câmara. O que mais há por ai são engravatinhos que tais. Hoje, pelo menos, vi uns quantos sentados na AR com ar de enfado.

I. disse...

Quando decidiram fazer lá o museu do botas, fiquei toda contente: é que faço questão de levar lá os meus sobrinhos e explicar, tintim por tintim, tudo sobre o senhor. E com visual aid.
(ainda me candidato a uma carga de porrada, mas o 25.04 foi para todos e a liberdade de expressão também, embrulhem)

Hipatia disse...

Nisso tens razão: foi mesmo para todos. Mas não abdico dos cães a cagarem-lhe em cima ;-)