La liberté est plus incompréhensible encore que la visite du médecin
De quel médecin une chandelle dans le désert
Au fond du jour la faible lueur d'une chandelle
Paul Éluard - La fin du monde
Não vou falar aqui da História. Vou contar antes uma estória.
Há alguns anos atrás, tive oportunidade de visitar um campo de concentração. Era já o fim da tarde e o sol teimava em querer esconder-se. Era um daqueles dias de Março em que a Primavera ainda resiste em fazer-se sentir, mas que nos deixa mesmo assim ver o brilho do sol. Penso que a grande maioria dos visitantes já teria partido. Não estava por lá muita gente. Os poucos que ficavam pareciam demasiado perdidos.
O sítio em si era maior do que qualquer fotografia me faria supor. Reconheci-lhe imediatamente alguns dos pormenores, de tantas vezes vistos em imagens de filmes, de livros... Ficava estranhamente desabrigado e, naquele dia de Março, das árvores que estavam à vista, escorriam estalactites de gelo, como lágrimas. Parecia-me tudo cinzento, como se a fuligem se tivesse entranhado nos caminhos, nos edifícios, no próprio céu, nas lápides, nas lajes, naquele tempo parado.
Fiquei profundamente chocada pelo silêncio. Acho que nunca estive num local tão silencioso. E, como nessas situações a nossa imaginação tende a tomar o freio, pensei que aquele talvez fosse verdadeiramente o silêncio da morte. Das mortes, aliás. Todas e cada uma que ocorreram naquele local. Todos os corpos que se tentaram fazer esquecer, todas as identidades que se tentaram apagar: milhões de judeus e de ciganos, mas também gentios. Deficientes, opositores políticos, homossexuais, testemunhas de Jeová, polacos, russos, criminosos de delito comum... A implacabilidade e a frieza da "solução final" reservava a todos um destino idêntico. Para no fim não restar mais do que silêncio.
Andei por lá, no meio desse profundo silêncio, a tentar imaginar o tamanho da hecatombe e a não conseguir. Porque a minha imaginação não conseguia estar preparada para tamanho horror. Mas, depois, friorenta, lembrei-me dos miseráveis e esburacados fatos de flanela listrados e das socas de madeira. E olhei aquele céu cinzento que nem o sol a fugir para o ocaso conseguia ludibriar. E olhei as estalactites de gelo. E senti-me gelar.
Não fui capaz de conter lágrimas silenciosas por tantas vidas perdidas, enquanto recordava a frase com que, muitos anos antes, uma professora tinha introduzido o tema do holocausto na minha memória: "a única maneira de sair daqui é pela chaminé"; ou pensar no absurdo racionalista da fórmula certa para o extermínio: um miligrama de zyklon por cada quilo de peso...
Foi nesse preciso momento que ouvi o som de um portão a ser fechado e, de súbito, fui acossada por um ataque de claustrofobia em pleno espaço aberto. Porque aquele silêncio assim quebrado me pesou toneladas. E tive de fugir daquele sítio, daquele pesadelo silencioso que não pode – nem deve – ser alguma vez apagado das memórias do Homem. Para que não volte a acontecer. Nunca mais!
Mas foi também nesse momento que me contaram a história de Hans Münch, o bacteriologista que trabalhava sobre as ordens de Mengele e, ainda assim e pondo em risco a própria vida, dava medicamentos e alimentos aos prisioneiros. E essa história ajudou a levantar parte do silêncio que me oprimia, parte da vontade de fuga que me cegava, parte do frio e do cinzento.
Ninguém pode deixar de lembrar o dia de hoje, o que ele significa. Ninguém pode deixar passar em claro o facto de, faz hoje sessenta anos, se terem aberto as portas que mostravam o terror dos terrores, Auschwitz/Birkenau e tudo o que isso significa para a Humanidade.
Mas, hoje, eu prefiro recordar o Dr. Hans Münch, descrito por muitos como "um ser humano dentro de um uniforme das SS". Lembrar o homem que – perante o gigantismo acéfalo da máquina de guerra nazi – fez a sua parte. E é verdadeiramente esta a estória que queria fazer recordar: a do único SS que escapou à morte nos julgamentos por crimes contra a humanidade, realizados na Polónia em 1947. A do médico que inventou experiências falsas para prolongar a vida dos seus prisioneiros. A do ariano que foi de propósito a Berlim recusar-se a fazer a selecção dos que deviam viver e dos que deviam morrer. A do homem que apôs uma das primeiras assinaturas a atestar a real existência dos campos de extermínio quando a História – como quase sempre acontece – tentou lavar a História.
Neste dia em que todos recordarão o holocausto e os milhões de mortos, eu recordo uma vida. Uma vida pouco conhecida de um homem que não foi um santo, que vestiu uma farda SS, que trabalhou em Auschwitz. Um homem que, ainda assim, fez uma pequena diferença, fez a sua parte, no meio da loucura e demência generalizadas que o rodeavam.
Dr. Wilhelm Hans Münch! Porque será que mais pessoas não conhecem este nome?
De quel médecin une chandelle dans le désert
Au fond du jour la faible lueur d'une chandelle
Paul Éluard - La fin du monde
Não vou falar aqui da História. Vou contar antes uma estória.
Há alguns anos atrás, tive oportunidade de visitar um campo de concentração. Era já o fim da tarde e o sol teimava em querer esconder-se. Era um daqueles dias de Março em que a Primavera ainda resiste em fazer-se sentir, mas que nos deixa mesmo assim ver o brilho do sol. Penso que a grande maioria dos visitantes já teria partido. Não estava por lá muita gente. Os poucos que ficavam pareciam demasiado perdidos.
O sítio em si era maior do que qualquer fotografia me faria supor. Reconheci-lhe imediatamente alguns dos pormenores, de tantas vezes vistos em imagens de filmes, de livros... Ficava estranhamente desabrigado e, naquele dia de Março, das árvores que estavam à vista, escorriam estalactites de gelo, como lágrimas. Parecia-me tudo cinzento, como se a fuligem se tivesse entranhado nos caminhos, nos edifícios, no próprio céu, nas lápides, nas lajes, naquele tempo parado.
Fiquei profundamente chocada pelo silêncio. Acho que nunca estive num local tão silencioso. E, como nessas situações a nossa imaginação tende a tomar o freio, pensei que aquele talvez fosse verdadeiramente o silêncio da morte. Das mortes, aliás. Todas e cada uma que ocorreram naquele local. Todos os corpos que se tentaram fazer esquecer, todas as identidades que se tentaram apagar: milhões de judeus e de ciganos, mas também gentios. Deficientes, opositores políticos, homossexuais, testemunhas de Jeová, polacos, russos, criminosos de delito comum... A implacabilidade e a frieza da "solução final" reservava a todos um destino idêntico. Para no fim não restar mais do que silêncio.
Andei por lá, no meio desse profundo silêncio, a tentar imaginar o tamanho da hecatombe e a não conseguir. Porque a minha imaginação não conseguia estar preparada para tamanho horror. Mas, depois, friorenta, lembrei-me dos miseráveis e esburacados fatos de flanela listrados e das socas de madeira. E olhei aquele céu cinzento que nem o sol a fugir para o ocaso conseguia ludibriar. E olhei as estalactites de gelo. E senti-me gelar.
Não fui capaz de conter lágrimas silenciosas por tantas vidas perdidas, enquanto recordava a frase com que, muitos anos antes, uma professora tinha introduzido o tema do holocausto na minha memória: "a única maneira de sair daqui é pela chaminé"; ou pensar no absurdo racionalista da fórmula certa para o extermínio: um miligrama de zyklon por cada quilo de peso...
Foi nesse preciso momento que ouvi o som de um portão a ser fechado e, de súbito, fui acossada por um ataque de claustrofobia em pleno espaço aberto. Porque aquele silêncio assim quebrado me pesou toneladas. E tive de fugir daquele sítio, daquele pesadelo silencioso que não pode – nem deve – ser alguma vez apagado das memórias do Homem. Para que não volte a acontecer. Nunca mais!
Mas foi também nesse momento que me contaram a história de Hans Münch, o bacteriologista que trabalhava sobre as ordens de Mengele e, ainda assim e pondo em risco a própria vida, dava medicamentos e alimentos aos prisioneiros. E essa história ajudou a levantar parte do silêncio que me oprimia, parte da vontade de fuga que me cegava, parte do frio e do cinzento.
Ninguém pode deixar de lembrar o dia de hoje, o que ele significa. Ninguém pode deixar passar em claro o facto de, faz hoje sessenta anos, se terem aberto as portas que mostravam o terror dos terrores, Auschwitz/Birkenau e tudo o que isso significa para a Humanidade.
Mas, hoje, eu prefiro recordar o Dr. Hans Münch, descrito por muitos como "um ser humano dentro de um uniforme das SS". Lembrar o homem que – perante o gigantismo acéfalo da máquina de guerra nazi – fez a sua parte. E é verdadeiramente esta a estória que queria fazer recordar: a do único SS que escapou à morte nos julgamentos por crimes contra a humanidade, realizados na Polónia em 1947. A do médico que inventou experiências falsas para prolongar a vida dos seus prisioneiros. A do ariano que foi de propósito a Berlim recusar-se a fazer a selecção dos que deviam viver e dos que deviam morrer. A do homem que apôs uma das primeiras assinaturas a atestar a real existência dos campos de extermínio quando a História – como quase sempre acontece – tentou lavar a História.
Neste dia em que todos recordarão o holocausto e os milhões de mortos, eu recordo uma vida. Uma vida pouco conhecida de um homem que não foi um santo, que vestiu uma farda SS, que trabalhou em Auschwitz. Um homem que, ainda assim, fez uma pequena diferença, fez a sua parte, no meio da loucura e demência generalizadas que o rodeavam.
Dr. Wilhelm Hans Münch! Porque será que mais pessoas não conhecem este nome?
11 comentários:
Sou sincera, eu não conhecia! Obrigada pelos teus textos de pequenas coisas que no fundo são muito importantes...e precisas.
Jinhos
Obrigada, Blue.
Sabes, não queria fazer um post triste ou demasiado empolgado, a falar de morte. Muitos outros, melhor do que eu, saberão escrever esses posts. E, sendo este um blog banal, de uma blogger banal, que fala de banalidades, preferi falar antes de uma vida quase anónima. Porque a História já encontrou os seus heróis e os seus algozes. E Hans Munch, por ter um pouco dos dois, não encaixa nos estereótipos.
____
"Já tive muito medo da morte, mas hoje já não tenho.
Sinto uma imensa tristeza que silencia qualquer justificação."
(Sim, já te leio desde Novembro... mesmo que não comente nunca. Perdoa e obrigada pelas visitas)
O Hans Münch é quase anónimo, Mofo. Talvez exactamente porque a História seja escrita pelos vencedores. Ele não tinha perfil de herói e os homens e as mulheres que ajudou e/ou salvou não deixaram que o transformassem em monstro. Ficou esquecido. Um rodapé apenas.
(sabes, acho que sou muito pouco positivista. As minhas emoções não deixam)
Beijo
Acho que o teu tópico reflecte precisamente a ideia que tenho destas memórias.
Custa-me saber que existem ainda campos de concentração a perpetuar mortes e horrores. Ou melhor, custa-me ver a insistência em relembrar o horror. "Arbeit macht Frei"... bolas. Nem sequer consigo imaginar mais 5 milhões de pessoas mortas de maneiras que nem dá para acreditar. É incrivel a imaginação perversa da mente humana. O que se passou na cabeça das pessoas?
Não achas que a mancha negra da história deveria ser transformada em qualquer coisa de bonita, tal como a estória que contaste de um ser humano no meio de tantas feras...
Não é o esquecer, mas o tornar belo um local ou um espaço que mata pelo silêncio e horror.
Ajudava a minimizar a dor.
Nem sei o que digo, nem sei que exemplos dar. Provavelmente insistir em recordar o que se passou é uma maneira de evitar que a história se repita. Mas já se repete. Com outros tons suaves e menos vermelhos, é certo, mas isso não é justificação.
Talvez quero acreditar que somos capazes de feitos belos assim como de feitos pavorosos.
Basta querer.
mil beijinhos.
A História (a tal História que é sempre construída pelos vencedores) parece ser feita de relatos de morte ou de relatos de heroísmo. Parece que nunca sobra espaço para se falar da gente que, por não fazer parte desses relatos, não tem direito a um lugar na História.
Só que a História - a verdadeira - é feita de gente anónima, gente vulgar, gente capaz de pequenos gestos de heroísmo, gente capaz de virar as costas, gente apanhada num turbilhão que não entende, gente que sobrevive, gente que morre.
Calculei que todos fossem falar de morte, à conta de Auschwitz... a mim não me apetecia. Foi só isso...
Beijinhos
On : 1/27/2005 4:18:16 PM Caliope (www) said:
Eu já pensei algumas vezes em visitar um campo de concentração. Mas sou demasiado susceptível a energias negativas ... Penso que deambulam por lá muitos fantasmas....
Tantos heróis que devem ter ficado esquecidos nestas histórias dos conturbados tempos de guerra.
Mas hoje trouxeste à luz do dia uma dessa histórias e eu adorei ler sobre algo que eu desconhecia
Um beijinho
On : 1/27/2005 4:27:12 PM Hipatia (www) said:
Sabes, o que mais gosto na estória do Hans Münch é ele não poder de forma alguma ser definido como um herói. Afinal, fez parte do "esforço de guerra" alemão, levado pela propaganda, alistou-se nas SS e não na "tropa macaca", tinha privilégios, nunca os perdeu e, provavelmente, reagiu muito tarde ao que se estava a passar. Isso faz dele alguém muito humano, muito próximo de todos nós. Ou, pelo menos, de todos aqueles de entre nós que ainda eram capazes de uma reacção. Ele fez uma parte pequena. Mas fez. Por cada um destes, deverá ter havido dezenas que apenas fecharam os olhos, encolheram os ombros e nada fizeram.
Beijinhos
On : 1/27/2005 4:35:23 PM Caliope (www) said:
Nunca se vai saber quais os motivos que o levaram a tomar as atitudes que tomou, mas fez uso de algo que se chama consciência.
E se isso em tempo de guerra, mais do que o dever, é um acto heróico
Beijnhos
On : 1/27/2005 4:42:22 PM Hipatia (www) said:
às vezes parece-me que ter consciência é um acto heróico em qualquer altura
Mas, visto dessa forma, será, sem dúvida heroismo.
Beijo
On : 1/27/2005 4:51:34 PM Caliope (www) said:
Sem dúvida....
Há cada vez menos consciência da inconsciência
On : 1/27/2005 4:55:53 PM Hipatia (www) said:
Pois. Deve ser por isso que gosto de histórias pouco glamorosas mas com muito conteúdo. Como esta, que seria demasiado banal não tivesse acontecido quando e onde aconteceu.
Mais um bj
On : 1/28/2005 12:21:04 PM Diálogos Interactivos (www) said:
O texto está soberbo.
A história do ser humano é fertil em holocaustos, barbaries, injustiças; é um mal congénito: De vez em quando há uns seres que degeneram e vêm, por alguma causalidade que desconheço, dotados de mais consciência e, é a esses que devemos tudo ode bom que hoje temos, incluindo os direitos humanos fundamentais pelos quais os nossos antepassados tanto lutaram, mas depois, os outros, os oportunistas quais ervas daninhas em seara alheia, acabam por corromper tudo aquilo que de bom se construio, e até acreditam que são uns iluminados e depois lá vêm a demência colectiva comandada
pelos cavaleiros do apocalipse, esperemos que não chequemos outra vez a esso ponto porque desta vez o holocausto seria muito maior.
Beijinhos
On : 1/29/2005 10:57:42 AM 1poucomais (www) said:
Belíssimo texto. Obrigada. Foi isso o que mais me pesou na visita a Dachau, recordo-o ao ler-te: o silêncio esmagador. E a vontade de fugir dali.
Tenho uma vaga ideia de ter ouvido falar desse médico. Vou procurar alguma coisa sobre ele.
On : 1/29/2005 1:22:53 PM vague (www) said:
De que forma o Dr. Munch conseguiu escapar a toda a propaganda e lavagem psicológica? Será q só a ele entre milhares, restou um lampejo de humanidade?
Não conhecia esta história, bonita, que nos mostra um ser humano dividido naquelas circunstâncias. E convém não esquecer que nós somos nós e as nossas circunstâncias. Até q ponto se nós tivéssemos vivido naquela época e contexto não teríamos aderido?
Isto é mais um exercício hipotético que outra coisa qualquer.
Em relação a visitas a campos de concentração, não me sinto especialmente atraída porque sei que seria sobretudo uma viagem ao interior do horror. Mas quem sabe, se um dia se proporcionar, a curiosidade não venha ao de cima, até porque
não podemos esquecer.
On : 1/29/2005 4:13:42 PM Hipatia (www) said:
Seria verdadeiramente horrendo, sim, Diálogos. E a Humanidade está sempre a um passo de descambar para a barbárie mais profunda e inqualificável. Resta-nos a esperança nesses tais que fogem a esse mal congénito e ainda nos conseguem iluminar trilhos de esperança. Mas será sempre muito mais fácil "construir" a História expondo figuras como Hitler como os verdadeiramente degenerados, o que provavelmente até foi, mas conseguiu arrastar povos inteiros com o seu demagogismo. E talvez isso seja ainda mais escabroso.
Beijinhos
On : 1/29/2005 4:26:31 PM Hipatia (www) said:
Não sei se o silêncio seria sempre igual. Naquele dia, pesou-me toneladas. Pelos vistos, Dachau, que não conheço (quase ia acrescentar um "felizmente") será semelhante.
Obrigada pela visita, Azul
On : 1/29/2005 4:34:58 PM Hipatia (www) said:
A minha dúvida é essa mesma: tivéssemos nós vivido na Alemanha dos anos 30 e 40, em que seriamos diferentes de tantos outros, que preferiram acreditar na propaganda, na demagogia, nas mentiras e nos discursos e fachadas glamorosas?...
Eu não me acho melhor do que ninguém. Sou mesmo demasiado banal. Tão banal que, provavelmente, também teria fechado os olhos, encolhido os ombros.
Hans Münch não foi verdadeiramente um herói. Não no seu sentido clássico. Ele acreditou de facto na propaganda. Tanto que, mesmo sendo considerado pelo partido Nazi como um "intocável" (i.e., não deveria nunca ser chamado ao exército) devido à sua importância como investigador, médico e cientista (acho que investigava o tifo), mesmo assim "meteu uma cunha" para ser mobilizado. E foi chamado para as SS e para Aucshwitz.
Ou seja, mesmo tendo sido em muitos aspectos um produto da sua sociedade e do seu tempo, ainda assim conseguiu preservar uma parte da sua consciência, da sua humanidade.
Se nos víssemos numa situação semelhante, gostaria de pensar que seriamos capazes do mesmo...
On : 1/30/2005 5:06:12 AM vague (www) said:
Eu acho que não e condeno isso e condenar-me-ia a mim própria posteriormente mas até q ponto..?
Não sei, sei é q se as pessoas estão 'presas' não conseguem escapar. Se lhes resta alguma liberdade interior, se conseguiram manter uma ténue esperança, lutam mesmo subterraneamente, contra o sistema. Este homem tinha poder.
Mas diferente, e heroi mesmo
foi Aristides de Sousa Mendes, cônsul português em Bordéus, q forjou vistos falsos e capturou da morte anunciada milhares de judeus.
On : 1/30/2005 10:15:19 AM Hipatia (www) said:
Não queria de forma alguma estabelecer qualquer tipo de paralelo entre Hans Münch e Sousa Mendes. Sousa Mendes não o merece, herói maior e esquecido pelos portugueses. Mas, provavelmente, deveria ter feito antes o post sobre Sousa Mendes do que o que fiz sobre Münch. Hoje já corrigi o erro.
"Quem salva uma vida, salva o mundo inteiro..." Pois então Sousa Mendes salvou este Mundo e todos os outros que hão de vir, já que foi - segundo os historiadores - a figura singular a salvar mais vidas com as suas acções. Mais do que Shindler, por exemplo. Só ainda não teve direito ao filme.
Münch é outra coisa. Não é um herói bonito e misericordioso. É só alguém que não esqueceu completamente a decência, uma réstia de humanidade. E, como não temos todos estofo de heróis, é a essa réstia de humanidade que me prendo com esperança.
Obrigada pelos contributos, Vague.
On : 1/30/2005 1:51:22 PM vague (www) said:
Ora essa, Hipatia, a ordem é indiferente ou se é escolhida é por algum motivo e sendo assim ou de outra maneira está sempre bem.
A personagem de Aristides de Souas Mendes fascina-me. Sabes que ele chegou a ser castigado pelo regime pelos crimes q praticou? (pois, forjar documento é crime...)
Quem escreveu essa frase 'quem salva uma vida salva o mundo inteiro'? dava um belíssimo título para post, no contexto actual da celebração dos 6o anos. Acho q falar sobre o assunto lá em 'casa'
Não agradeças, ora :)
On : 1/30/2005 1:51:30 PM vague (www) said:
Ora essa, Hipatia, a ordem é indiferente ou se é escolhida é por algum motivo e sendo assim ou de outra maneira está sempre bem.
A personagem de Aristides de Souas Mendes fascina-me. Sabes que ele chegou a ser castigado pelo regime pelos crimes q praticou? (pois, forjar documento é crime...)
Quem escreveu essa frase 'quem salva uma vida salva o mundo inteiro'? dava um belíssimo título para post, no contexto actual da celebração dos 6o anos. Acho q falar sobre o assunto lá em 'casa'
Não agradeças, ora :)
On : 1/30/2005 2:27:26 PM Hipatia (www) said:
A frase é do Talmud e é a que está inscrita em todas as medalhas das figuras que o Estado Israelita homenageou como "homens justos". Aristides Sousa Mendes é um deles. A família recebeu a medalha a título póstumo, em Nova Iorque (o Estado Português "afastou-se" do gesto). Aristides também tem uma árvore no Jardim dos Justos (acho que é assim que se chama). E, sim, dava um belíssimo post
O "herói" falando: Na conversa sincera com o repórter da Der Spiegel, mudou de tom e demonstrou a velha convicção nazista de que é preciso exterminar os judeus. Lembra-se com desprezo dos prisioneiros recém-chegados do Leste Europeu, chicoteados como animais para fora dos trens: "Uma escória abominável. Tão servis que não se podia sequer qualificá-los
de seres humanos"."
Eu não vejo nada de bom homem nesse cara.
TExto retirado: http://holocausto-doc.blogspot.com/2007/08/hans-mnch-mdico-de-auschwitz.html
Aproveitando para responder ao anónimo acima, remeto para uma outra caixa de comentários (04/08/2008) onde me cobravam uma revisão do post porque alguém tinha revisto a história:
Olá,
Goataria que você revisse o seu post sobre Hans Münch. Leia a matéria abaixo...
Grato.
http://br.groups.yahoo.com/group...s/message/ 14527
Alexandre | | 08.05.08 - 7:24 am | #
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Desculpe, ainda sobre Munch, podes ver este link também:
http://www.morasha.com.br/conteu.../ed25/ amigo.htm
Além do filme "The Last Days, dirigido por Steven Spielberg".
Gosto do seu blog. Estou dando as informações para que não fique registrada um post não verdadeiro.
Alexandre | | 08.05.08 - 7:42 am | #
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Alexandre, não vou rever um post antigo. Primeiro, porque nenhum dos meus posts é sobre História, mesmo quando fala de história; depois, tal como disse no início desse post, não ia mesmo falar de História, ia contar uma história, a mesma que a guia turística nos contou. E qual verdade? Se a história foi agora revista à conta de um documentário, o certo é que ninguém pode negar que, nos julgamentos a que foi sujeito, Münch foi defendido pelos próprios judeus que tinha à sua guarda. O homem é um monstro? Que seja. A questão que pretendia levantar então mantém-se: quantos, naquelas circunstâncias sociais e históricas não tinham sido monstros iguais ou piores? É fácil olhar para trás, com os olhos dos vencedores e depois de tanto ano passado e dizer "monstro". Eu, que não me julgo melhor do que ninguém, olho para trás e penso "que teria eu feito?". E, como não sei a resposta, tenho medo de apontar o dedo.
Hipatia | | Email | Homepage | 08.05.08 - 2:33 pm | #
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Já agora:
«In March 2000, the documentary film Die letzten Tage was released in the German cinemas. In 1999, this film had already been released in the USA with the original title The Last Days and the suitability recommendation for 16 years of age. The film was supported by the "Survivors of the Shoa Visual History Foundation", which had been founded by Steven Spielberg. Dr. Münch participated in this documentary film. As a contemporary witness, he met and talked with the surviving camp inmate Renée Firestone, whose sister had died in Auschwitz during experiments with humans. A film review pointed out that the American version of the film had no clear indication about the fact, that the contemporary witness Dr. Münch already suffered from the Alzheimer's disease at this point of time. Only the credits of the film would provide this information, and are in French.» (http://en.wikipedia.org/wiki/Hans_Munch)
Não sei se prefiro a versão da História antes ou depois da doença de Alzheimer e parece-me suspeito que o documentário fizesse questão de não a referir. E não sei qual é a versão verdadeira, tirando o facto de Munch ter sido de facto o único SS a ser absolvido nos julgamentos da Polónia e o ter sido com base nos testemunhos de defesa de judeus. Por isso, que post não verdadeiro está registado? Aquele que conta a versão do SS perdoado, ou a versão que conta Spielberg, esquecendo de mencionar a doença debilitante?
Hipatia | | Email | Homepage | 08.05.08 - 6:35 pm | #
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A História não foi revista a custa de um documentário, mas de uma declaração (entrevista) do próprio Munch, anos antes da doença. Mas, tudo bem. A história desse homem é um ponto controverso da História.
Alexandre | | 08.05.08 - 7:07 pm | #
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Neste caso, a História não é contada por "vencedores", mas pelas vítimas da monstruosidade nazista. É fato que Munch foi absolvido. Também é fato que Munch não foi uma das vítimas.
Continuo a achar giro o seu blog.
Alexandre | | 08.05.08 - 7:14 pm | #
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...Quem sabe, se na história de Munch, não se pode dizer que "vida descostura, o homem passa a linha, a corrigir os panos do tempo."?
Alexandre | | 08.05.08 - 7:16 pm | #
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Alexandre, fui buscar a citação em inglês da Wikipedia porque pretendia uma visão anglófona da tal versão contada no documentário de Spielberg, porque a versão americana parece que não é exactamente igual à europeia. E esse realizador está de que lado, afinal? Dos que perderam? Os americanos ganharam a guerra, fazendo o que foi preciso naquele momento. É o piloto do Enola Gay um monstro? Truman, que deu a ordem para que Hiroshima e Nagasáqui acontecessem? Obviamente que não, se não os tirarmos dos seus contextos. Mas esses, evidentemente, ninguém questionou na sua versão de heróis.
E que faz Spielberg senão tentar reescrever a história meio século depois, entrevistando um homem com uma doença mental degenerativa e esquecendo-se de o mencionar? E que fez ele à memória dos que testemunharam a favor de Münch? Chamou-lhes mentirosos ou, pior ainda, fez com que nem sequer existissem, tirando-lhes o pouco que lhes restava no fim da guerra: o direito de testemunharem e acusarem os seus algozes. Grande diferença na maneira como eu vejo o costurar e descosturar dos panos.
Münch não era um herói. Nem era um santo. Os factos dizem-nos que fez experiências com seres humanos num dos piores campos de concentração da História. Quem sou eu para o defender? Mas também quem sou eu para o atacar, se aqueles que o podiam e deviam ter feito escolheram antes defendê-lo e salvá-lo imediatamente após os factos e não meio século depois?
Hipatia | | Email | Homepage | 08.05.08 - 11:13 pm | #
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Concordo com quase tudo. Mas, mesmo assim, o post referido careceria destas afirmações de agora. Alguém que o leia somente, ainda deve achar que estas a encomiar o homem.
Encerro, de minha parte. Beijinhos.
Alexandre | | 08.05.08 - 11:46 pm | #
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Talvez seja ai que nunca vamos concordar, Alexandre. O que para mim está a mais é o revisionismo. Eu no post original contei uma história, tal como me foi contada a mim, baseada no que se passou a seguir à WWII. E a verdade que dali retiro é que nenhum de nós pode alguma vez acusar e apontar o dedo se antes não se tentar questionar sobre o que teria feito. E, por mais que todos pensem que seriam heróis, na verdade quase todos seriamos demasiado parecidos com Münch.
Depois, acho mesmo perigoso esta coisa de tentar rever a história. E, se não temos cuidado, ainda acabamos a questionar o que não devemos, como por exemplo as notícias que apareceram hoje nos jornais portugueses sobre a política de Israel de trocar assistência médica aos palestinianos por traições. E o horror do Holocausto - que nunca deverá ser esquecido - fica contaminado e as acções de um judeu americano com uma câmara na mão e exposição mediática passam a ter ar de lavagem de alguma coisa. Porque todas as coisas acontecem num contexto e, às vezes, até é preferível não ver esse contexto para não passarmos a questionar o inquestionável.
Hipatia | | Email | Homepage | 08.06.08 - 12:13 am | #
Hans Münch não foi nem de longe o ser humano que você descreveu. Era tudo falso, um joguinho para ele não morrer como os outros nazistas. Leia essa entrevista, que ele deu aos 93 anos de idade, e verá como tudo não passava de fingimento de um homem frio e sem caráter, que matava judeus com prazer e um sorriso no rosto: http://holocausto-doc.blogspot.com/2007/08/hans-mnch-mdico-de-auschwitz.html
Hans munch foi um monstro como todos os outros! Sabia que ele nunca sentiu remorso do presenciou? Ele morreu dizendo que todos os Judeus morreram no holocausto! Lixo ele! Espero que esteja queimando no inferno!
Hans munch foi um monstro como todos os outros! Sabia que ele nunca sentiu remorso do presenciou? Ele morreu dizendo que todos os Judeus morreram no holocausto! Lixo ele! Espero que esteja queimando no inferno!
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