2006-01-22

O Desejado já não pode vir


Óleo de Carlos Alberto Santos

É preciso enterrar el-rei Sebastião
é preciso dizer a toda a gente
que o Desejado já não pode vir.
É preciso quebrar na ideia e na canção
a guitarra fantástica e doente
que alguém trouxe de Alcácer Quibir.

Eu digo que está morto.
Deixai em paz el-rei Sebastião
deixai-o no desastre e na loucura.
Sem precisarmos de sair o porto
temos aqui à mão
a terra da aventura.

Vós que trazeis por dentro
de cada gesto
uma cansada humilhação
deixai falar na vossa voz a voz do vento
cantai em tom de grito e de protesto
matai dentro de vós el-rei Sebastião.

Quem vai tocar a rebate
os sinos de Portugal?
Poeta: é tempo de um punhal
por dentro da canção.
Que é preciso bater em quem nos bate
é preciso enterrar el-rei Sebastião.

Manuel Alegre - Abaixo el-rei Sebastião


Que mania esta nossa de, em cada geração, inventarmos mais um D. Sebastião! E continuamos a construir um País de miragens, com Desejados que nunca o são. Salvadores da pátria de pés de barro, boca aberta para o tédio e a frustação. Matemos em nós o Encoberto! O Desejado já não há-de vir. Nunca veio, afinal.

1 comentário:

Hipatia disse...

On : 1/22/2006 12:35:34 PM deep (www) said:

D.Sebastião, tenha ele a forma ou o rosto que tiver, é a desculpa muitas vezes encontrada para não agirmos, para não tomarmos iniciativas... é o logo se vê...
Boa semana


On : 1/22/2006 2:01:04 PM Hipatia (www) said:

Já calcamos tanto chão desde que o tipo se perdeu em Alcácer Quibir, que já era tempo de termos aprendido alguma coisa, não é, Deep? Mas é sempre fácil inventar miragens

Boa semana e um beijinho